A linguagem sedutora da rádio

A linguagem sedutora da rádio



Cristina Romo

A rádio é o meio sonoro por excelência. É, seguindo McLuhan, a extensão da boca, da laringe, dos pulmões do homem; mas, mais ainda, é o altifalante do cérebro humano. Que melhor instrumento para a fala!

Tradução e adaptação

Rui de Melo

Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de Salamanca

e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto

 

A rádio é o meio sonoro por excelência. É, seguindo McLuhan, a extensão da boca, da laringe, dos pulmões do homem; mas, mais ainda, é o altifalante do cérebro humano. Que melhor instrumento para a fala!

A fala da rádio é a única existente quando se emite, se é que há um interlocutor que a percebe, e não apenas receptor. Um receptor só recebe. Um interlocutor, além de ouvir, processa e ressemantiza; recria e evoca; usa e faz «coisas» com as palavras.

Se é que há alguém que a percebe. Se é que houve alguém que conseguiu convocá-la para o diálogo criativo que se pode estabelecer através do ar entre pessoas que são sensíveis e que são capazes de significar em comum, ainda quando não haja uma resposta imediata, em presença e através do mesmo canal, como exigem os puristas para catalogar como comunicativo um processo. Precisamente aí é onde está a chave da comunicação radiofónica: em que se pode dar embora os interlocutores não se vejam; a maioria das vezes nem se conhecem, mas se podem entender e podem criar sentido em comum.

Porque a linguagem radiofónica não tem limites, e exige isso, que não haja limites, já que o meio está aberto para que através dele transitem e se movam com liberdade as palavras, os enunciados, as ideias, os pensamentos, os sentimentos, o acontecer, o humor, a filosofia, a vida. Tudo o que pode ser expresso com palavras pode ser transmitido por rádio, e que coisas não podem ser expressas com palavras ou transformadas em sons?

Por isto indignam tanto os improvisados falantes, os que têm, com frequência, o vocabulário mais reduzido; os que são incapazes de procurar e encontrar todas as possibilidades da língua; os que se conformam com as formas de expressão mais trilhadas, os que têm tomados, ocupados, os microfones da maior parte das cabinas das emissoras, pelo menos neste país.

Frases que não resistem à mais pequena análise, são pronunciadas dia a dia, minuto a minuto através da rádio. Não é raro ouvir:

— “Os responsáveis fugiram e estão a monte».

— “A sociedade civil».

— “Segundo informação de fonte próxima».

— «Não responderam ao pedido de informação».

— «Alegadamente mataram um jovem por não obedecer ao sinal de paragem».

Os locutores e todos os falantes da rádio têm, ainda sem o saber ou assumir, a responsabilidade do uso social da língua, já que boa parte da população não tem outro contacto com ela a não ser o que ouve na rádio e na televisão; o uso pessoal, quotidiano, como todos sabemos, é reduzido, repetitivo, obvio; limita-se ao doméstico e aos amplos espaços de silêncio nos quais vivem, por exemplo, as mulheres, embora se diga o contrário, e é muito injusto que os sujeitem à verborreia e às canções insubstanciais com que se costumam preencher os espaços radiofónicos.

A um meio oral como a rádio correspondem, necessariamente, tarefas iniludíveis, como o resguardo, purificação, ampliação e difusão da língua.

A língua modifica-se. Sim, isso ninguém o duvida nem se deve evitar. É um ente vivo, em mudança, social e como tal é afectado pelo que acontece na sociedade e sua evolução. Constatamos que há vocábulos que deixámos de ouvir e de usar porque o contexto e as circunstancias em que se davam não existem mais ou modificaram-se. Assim, já não chamamos pena ao utensílio para escrever; nem dizemos atiça o fogão ao começar a cozinhar; nem falamos de jornadas para nos referirmos à distância. Por outro lado, começam a ser palavras de uso comum: computador, estar em rede, processador (de alimentos, de palavras), envio-te um fax ou um mail.

Essas são modificações naturais que respondem às mudanças correspondentes na vida quotidiana. Boa parte das transformações da língua provém dos meios de comunicação que não obedecem, obrigatoriamente, ao uso natural e social da mesma, mas a imposições alheias ou a certa economia de palavras. Assim se vão eliminando pouco a pouco os artigos e se incorpora o desnecessário e incorrecto uso do gerúndio, que são peculiaridades próprias do inglês, como: «Feitor vai estar nos olímpicos», ouvido aqui o ano passado, ou a expressão: «Governando é a melhor forma de servir o povo».

Numa conferência sobre os meios de comunicação e a língua, Juan Lope Blanch dizia[1]:

«A língua é algo muito sério e deve merecer todo o nosso respeito. É um bem comum — o máximo bem humano — e não podemos brincar com ela caprichosamente: pertence a todos, e ninguém tem o direito de a alterar ao seu particular capricho. Todos devemos cuidar dela com devoção, sem a deformar nem a corromper ao nosso gosto...

E nesse labor de cuidadosa conservação de um bem comum a milhões de falantes, têm a máxima responsabilidade os que dispõem de meios de difusão linguística tão poderosos como são a rádio e a televisão.».

A fala da rádio não está só, nem se atém somente às suas possibilidades, conta com o recurso da música e de todos os sons e, no conjunto, formam a linguagem radiofónica. Armand Balsebre[2] no seu livro A linguagem radiofónica diz que «se constitui com os sistemas expressivos da palavra, da música e dos efeitos sonoros» e define o sistema semântico radiofónico como uma «sucessão ordenada, contínua e significativa de 'ruídos' elaborados pelas pessoas, os instrumentos musicais ou a natureza, e classificados segundo os reportórios/códigos da linguagem radiofónico». [3]

Tão grave é considerar a rádio como apenas emissão de música, como as emissoras que só crêem na palavra falada, sem fazer uso de outros recursos sonoros; seria tanto como fazer um programa em que houvesse só efeitos sonoros, como os que se fazem em spots publicitários ou em radionovelas. Os três são elementos indispensáveis na rádio.

Uma boa parte dos responsáveis da rádio alteraram a vocação do meio e transformaram-no só em difusor da música. Embora a música seja um dos principais produtos sonoros e, por fim, é um importante conteúdo da rádio, falar de rádio desta maneira, é uma simplificação e um empobrecimento do meio. De facto, a rádio é um meio desperdiçado, e como diz Angel Faus[4], um meio desconhecido. Desconhecido e desperdiçado nas suas possibilidades, nas suas potencialidades, na sua capacidade expressiva e comunicativa. Antes querem dotá-la das características de outros meios, perante os quais pode parecer limitado. Assim se diz da rádio que é imprecisa, que carece da força do permanente, que é limitado o seu acesso sensorial, e precisamente, por essas características, a rádio é pessoal, próxima, própria. Por isso é flexível; por isso pode despertar a imaginação e fazer-nos passear por lugares ignotos, transmitir sentimentos profundos, transitar pelo tempo. Ir e vir, subir e descer, abrir e fechar.

Fazer rádio é estabelecer comunicação, criar sentido em comum. É considerar o receptor como um interlocutor; porque a rádio provoca na audiência uma relação pessoal graças à qualidade do som de ser introspectivo; à possibilidade de que, quem ouve, recrie a mensagem de acordo com a sua experiência, as suas vivências, a sua história. O ouvido é um sentido atento, que não se fecha ou se apaga; que convida e propicia a introspecção para um mundo interno pleno de experiências e sensações visuais, tácteis, auditivas A linguagem radiofónica é flexível e permite expressar quase qualquer coisa, porque apela à imaginação e à boa vontade do que ouve. Daí, que o elemento mais importante seja a fala, a palavra, a voz, sem perder de vista que vai acompanhada da música e o ambiente sonoro.

A palavra é acção e é acto. Tomar a palavra, é uma das tarefas próprias do homem vivo. «A palavra é para o homem começo de existência, afirmação de si na ordem social e na ordem moral. Antes da palavra só há o silêncio da vida orgânica que, contudo, não é um silêncio de morte, pois toda a vida é comunicação», em palavras de Gusdorf.[5]

Embora muitos verbos se refiram a uma acção, há palavras que são o que dizem, no facto de dizê-las. Uma destas é nomear, com o que o homem chama à existência a isso ao qual nomeia; chamar às coisas pelo seu nome, é uma maneira de expressar a sua essência. Outra dessas palavras é, precisamente, radiar ou falar por rádio, comunicar por rádio. Fala-me, fala-nos, tu falas; diz-me, diz-nos, tu dizes. A palavra radiofónica está aí para convencer, aconselhar, acariciar, recordar, evocar, convocar, provocar, afagar; mas nunca para murmurar, insultar, irritar, afastar. Na rádio não há acção nem comunicação sem a palavra.

Quando um locutor de rádio ou a locutora de rádio só faz uso da sua capacidade verbal e das características do meio, leva a cabo um acto exclusivamente fonético, locucionário, em termos de J.L. Austin.[6] Trata-se de um leitor de textos que outros escreveram, um apresentador mecânico de canções, embora haja um certo sentido e alguma referência; mas que não é explícito: «Ouvimos Luis Miguel sobre chamado incondicional».

Ao transmitir um anúncio, ao descrever e enunciar, quando o locutor lê as notícias, é provável que esteja a dar um passo mais e então procure uma resposta, para conseguir um efeito: comprar ou usar um produto ou serviço; advertir, informar. Só pede que receba e entenda. Ao dizer, basta; ao falar, cumpre. Realiza um acto fático e com frequência as consequências não importam. A linguagem pode resultar sem sentido ou ser confusa. Como naquela ocasião em que o condutor de uma entrevista perguntava: «Utilizam que aparelhos?» onde o locutor, distraído com a sua verborreia, repentinamente dá-se conta que tem que perguntar algo, fá-lo a correr, sem reflectir e retorce uma simples pergunta como “Que aparelhos utilizam?”, em algo trapalhão e confuso. Ou quando um noticiário abriu com o seguinte: «“o PSD ganhou as eleições em Aveiro”, disse fulano de tal, presidente da Câmara desse partido», e o jornalista de serviço à escuta, que se distraiu e que, com certeza, não viu as aspas, comentou depois uma informação errónea.

O locutor de rádio é eficaz quando não lhe basta dizer algo, mas quando ao dizê-lo realiza uma acção; então são muito claras as suas intenções de comunicar, de entrar em relação com o ouvinte, com o seu interlocutor, através de actos de fala em que se consegue algo (perlocução); porque se convenceu, se persuadiu, não se obrigou. Porque é ele ou ela quem fala, quem diz e não outro.

A linguagem radiofónica é por natureza uma linguagem oral. Contudo, embora pareça exagero, é preciso destacar e repetir porque há desatenção ao que dizem os falantes, os emissores, os locutores. A linguagem oral caracteriza-se pela sua construção simultânea com o pensamento. Elabora-se em situação; é um raciocínio que se vai fazendo. Embora a sua finalidade seja convencer, informar, interrogar, também é ouvir e deixar-se convencer, inteirar-se e responder.

O falante de rádio é também um ouvinte, e isso mais ou menos o compreende o que improvisa, mas aos que escrevem para a rádio se lhes esquece muitas vezes de usar um código escrito, para ser lido e não uma linguagem oral para ser ouvido. Com frequência isto acontece com os repórteres de informativos, aos que lhes interessa mais emitir a informação que a sua compreensão.

A concepção da linguagem na rádio costuma ser escrita e não oral. Se quere manejá-lo e programá-lo desde o código escrito e não desde a fala. os textos se escrevem sem respeitar ou sem recordar que serão lidos em voz alta e em presença de ninguém, e que, ao mesmo tempo, deverão ser ouvidos, percebidos, recebidos, assumidos, por seres humanos, que estão em outra parte e que querem dialogar com ele e que aceitam a convocação, mas que não podem captar a intenção, a riqueza e a expressividade, se estas não são transmitidas, isto é, se não estão na mensagem que se lhe envia. «Só quando a escrita se lê, em voz alta, quando se locuta (sic), só então, o acento de uma grafia adquire ânimo ou sopro de vida».[7]

A linguagem radiofónica estrutura-se com base na linguagem coloquial, familiar, próxima, e por essa razão penetra no ouvinte. A rádio é um meio que nos convoca, nos chama e, embora o faça pessoalmente, de forma íntima, somos muitos, uma comunidade social a ser convocada pela mensagem. Graças a esse carácter pessoal e social ao mesmo tempo, a linguagem radiofónica, composta pelos elementos sonoros necessários, é capaz de suscitar, por força das palavras, a sua capacidade de receber o que tem significado comum e a experiência própria dos interlocutores, a presença de factos, sentimentos, sucessos passados; evocar o que tem sentido.

É um jogo, pessoal e comunitário. O ouvinte não está isolado, nem só, embora seja único. Não é somente membro de um grupo social; é um e parte, pelo que de comum pode construir com outros desde si mesmo e a sua experiência. A capacidade evocadora da rádio que faz que a experiência acumulada se represente em comum, se traga à colação, sirva de base ao que se diz agora, permite a comunicação.

De convocar, evocar e provocar, a rádio pode fazer um uso ilimitado deste último, da provocação. «Provocar não significa irritar alguém gratuitamente para que se enoje. Provocar é chamar, chamar-nos em pro, em favor de uma causa, um valor, uma fé, uma vida», diz Raúl Mora, ocasional filósofo da comunicação.

Por seu lado, Fernando Vásquez diz que “a rádio é o meio que mais provoca mentiras e que o torna mais possível. Pelas suas mensagens provocadoras e tendenciosas um homem ou um povo pode pegar numa arma; pelas suas 'entorses de informação', pela sua pressa em dar o 'recado' alguém pode criar pânico ou condenar um inocente”.[8] A capacidade provocativa é, como afirmado acima, ilimitado. Trata-se de provocar diálogo, imaginação, discussão, fantasia, conversa, poesia.

Embora nas primeiras transmissões apenas se tenham imitado outras formas expressivas, desde o início o potencial da linguagem foi reconhecido, as possibilidades da fala radiofónica. A linguagem que a rádio exige é aquela que tira o máximo proveito das características do oral; com ela, a comunicação ocorre numa estrutura de calor humano; além disso, essa linguagem cria esse calor, que Fernando Vásquez define da seguinte forma: «o calor que, mesmo que imaginário, possa parecer gestual, cheio de barulho, insistência e acentuação muito especial»[9], e a que atribui o mesmo espírito e nuance que o diálogo, a discussão e o debate possuem.

A linguagem radiofónica - palavra, música e sons - pode criar ambientes, configurações, cenários, figurinos, climas, sentimentos, ilusões, alegrias, medos, desde que seja bem estruturada, usada adequadamente e oportunamente emitida. Numa ocasião, ao perguntar a uma criança qual era o seu meio favorito, respondeu que gostava mais de rádio porque os cenários eram mais vivos. As possibilidades, com a facilidade que o som oferece, são praticamente infinitas para o melodrama. As mulheres mais bonitas do mundo são aquelas que atravessam os cenários da rádio e são cortejadas pelos galãs mais bem-sucedidos e bonitos. Susana e Juan Carlos, "os galãs têm sempre o nome de Juan Carlos e apaixonam-se por Susana", diz Antonio Skármeta[10], quando também afirma: "a minha infância foi um longo idílio com a rádio", que ouvia junto com sua avó «que era gorda e doce» e nos anúncios ela «prognosticava com um forte sotaque iugoslavo o que aconteceria nos próximos minutos com a heroína ".

Os protagonistas do drama radiofónico, que viajam pelos melhores lugares do mundo e que de um dia para o outro podem aparecer como habitantes do bairro mais pobre, velhos e abandonados, podem fazê-lo porque os fatos existem como são ditos. Infelizmente, o drama de rádio é um género em extinção que deve ser recuperado para bem do público e do próprio recurso, para múltiplos propósitos, especialmente educacionais e culturais.

O locutor, como observador dos eventos e uma ponte entre eles e a audiência, pode tornar presente a esta aquilo que narra; tornar-se credível e provocador de fantasias. O próprio Skármeta disse que na sua infância "os fantásticos locutores de rádio fizeram do jogo de futebol mais chato uma contenda mítica". Os jovens de hoje perderam a oportunidade de ver com os olhos da alma o que está acontecendo no mundo; só conseguem ver com o código estonteante de videoclipes numa tela, seja na televisão ou num computador, e são capazes de acreditar no que a tecnologia virtual apresenta, e eles não aceitam que ouvir as touradas na rádio era uma experiência real, própria e pessoal, na qual as faenas eram realizadas e como todos eram capazes de vê-las na sua imaginação pelo que descreviam Paco Malgesto e Pepe Alameda. Quando se trata de som, os ouvidos modernos aceitam sem replicar a estridência, o som ensurdecedor e atrofiante. Há que recuperá-los.

É necessário restabelecer a rica vida da rádio, incorporar a palavra novamente, além do mero anúncio da próxima melodia ou da transmissão de informações frias. A palavra da rádio, para cumprir a sua missão de comunicar e honrar seu potencial, deve ser estruturada em linhas que garantam sua receção.

Devido à imprecisão do som, que é facilmente perdida e está sujeita a distrações, especialmente visual, a redundância é um elemento a que se deve recorrer frequentemente, seja alterando o contexto, explicando uma situação ou adicionando um exemplo; o importante é garantir que a ideia possa ser percebida adequadamente.

Na rádio, a linguagem deve ser muito "visual", pois tentará substituir os olhos. A pessoa cega involuntária na qual o ouvinte de rádio se torna requer a disponibilidade das informações e referências que lhe permitam perceber completamente. Felizmente, para esses propósitos, contamos com a linguagem oral que é sedutora, emocional, expressiva, ou pode sê-lo, basta remover o linear e girá-lo em torno do que se quer dizer, adicionando, de cada vez, imagens, figuras e elementos provocativos. Escolher o tom e até o tipo de voz de acordo com os propósitos que se deseja alcançar, a hora do dia e o público a que se dirige; de preferência sempre em forma coloquial, como quem conversa.

A palavra vazia é inimiga da palavra radiofónica. Os gritos desenfreados que são um alarido sem sentido, muito frequentes em nossas emissoras, onde risos e gritos se encontram com expressões que somente aqueles que estão dentro da cabine entendem, porque se baseiam em referências particulares. Perto da conversa fiada e barulhenta está o uso de gritos para convencer, chamar a atenção e, portanto, impor, quando é a voz íntima, baixa e pessoal, que comunica e convence os interlocutores. Por seu lado, o tom de “sabe tudo”, a impostação da voz e a verborreia são práticas que afastam o ouvinte; ninguém ouve rádio para ser repreendido.

A rádio é um convite ao diálogo, à conversa, que é "uma das maneiras mais significativas de estarmos juntos".[11] O diálogo ocorre entre interlocutores que tentam a comunicação interpessoal; no entanto, Pasquali[12] diz que «a comunicação com o meio de comunicação introduziu uma injustiça distributiva no diálogo humano porque tende a favorecer o emissor e a minimizar ou silenciar o destinatário ou usuário. O recetor está cada vez mais numa situação de diálogo interrompido, de não poder responder imediatamente».

O bom emissor que tenta comunicar é aquele que considera o ouvinte imaginário como alguém concreto e a ele se dirige com a intenção de receber uma resposta dialógica, e não na forma de um monólogo, e é por isso que ele recorre a certos usos pronominais que tornam o ouvinte presente, com possíveis expressões ao fazer referências pessoais, como: você que me ouve, como sabe, especialmente para si, de acordo com o que preferir, o que acha se agora vamos…

Escrita ou improvisada, a linguagem verbal da rádio é igual à linguagem cotidiana. No entanto, requer um tratamento sintático que facilite a perceção e a comunicação, para que seja atraente, sugestiva, provocadora, visual, pessoal, adequada. Por exemplo, é aconselhável estruturar o discurso com frases curtas, mas concluídas, pois, os ouvintes não vão esperar para ver se completam as informações; se não entender ou não estiver interessado, abandona a audição.

Sugere-se que as frases sejam construídas da maneira clássica - sujeito, verbo e complementos - para facilitar o entendimento. Da mesma forma, a repetição frequente do assunto e a evitar desvios desnecessários farão com que o público saiba sobre o que ou quem se está a falar; além disso, sempre devemos assumir que novos ouvintes se juntaram a nós.

É necessário usar uma pontuação inovadora, que não é a utilizada na escrita, mas a que responde mais à intenção e ao código oral, com base na pronunciação, sotaque, ênfase, pausas, silêncios, música, os efeitos.

A forma mais atual de comunicação e a linguagem mais moderna é a visual, vertiginosa e intermitente da televisão, do vídeo e do computador; mas, precisamente, trata-se de recuperar o pacífico, o calmo, o pessoal, o íntimo do oral. Parafraseando que o sabor foi inventado por Deus ara nos acariciar por dentro, o som, a música, a palavra falada e sua combinação correta foram inventadas para acariciar as nossas mentes e, mais ainda, a nossa alma.

NOTAS:

  1. Lope Blanch, Juan. Los medios de información y la lengua española, UNAM, México, 1988, p.15.

 

Tradução e adaptação

Rui de Melo

Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de Salamanca

e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto



[1] Lope Blanch, Juan. Los medios de información y la lengua española, UNAM, México, 1988, p.15.

[2] Balsebre, Armand. El lenguaje radiofónico, Madrid, 1994, p.24.

[3] Ibídem, p.20.

[4] Cfr. Faus Belau, Ángel. La radio, introducción a un medio desconocido, Guadiana de Publicaciones, Madrid, 1973.

[5] Gusdorf, Georges. La palabra, Galatea/Nueva Visión, Buenos Aires, 1957, p.77.

[6] Cfr. Austin, J.L. Cómo hacer cosas con palabras, Paidós, Barcelona, 1996.

[7] Vásquez Rodriguez, Fernando. "El libreto literario para radio: una artesanía recuperable", Cuadernos Diálogos de la comunicación, nº15, marzo 1991.

[8] Ibid

[9] Skármeta, Antonio. "¡Reina radio, soy tu esclavo!", Nueva sociedad, nº 100, marzo-abril 1989, Caracas.

[10] Ibid.

[11] Gusdorf, Op. cit. p.84.

[12] Pascuali, Antonio. El orden reina. Escritos sobre comunicaciones, Monte Ávila, Caracas, 1991.

 

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