A importância da entoação na informação radiofónica

O que determina a perceção e o entendimento adequados das notícias no meio de rádio? Na ausência de estímulos diferentes do som, o público é guiado não apenas pelo conteúdo, mas principalmente pela forma de apresentação verbal.  

Anexo n ° da Revista QUADERNS DE FILOLOGIA

Facultat De Filologia

Carme de-la-Mota1 e Emma Rodero2 

Universidade Autónoma de Barcelona1, 

Universidade Pompeu Fabra2


Tradução e adaptação

Rui de Melo

Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de Salamanca

e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto


O que determina a perceção e o entendimento adequados das notícias no meio de rádio? Na ausência de estímulos diferentes do som, o público é guiado não apenas pelo conteúdo, mas principalmente pela forma de apresentação verbal. Nesse sentido, grande parte da eficácia da comunicação via rádio baseia-se no uso ideal da entoação, do qual depende, primeiro, que o ouvinte preste atenção à mensagem e, em segundo lugar, para assimilar e entendê-la, pois contribui para a perceção estruturada da mensagem (Hirschberg e Pierrehumbert 1986; Elordieta e Romera, 2004). A prosódia, como destacado por Briz et alii (2008: 128-129), permite "o progresso e o progresso do discurso", uma vez que é crucial "marcar a progressão temática, contribuindo decisivamente para delimitar os diferentes tópicos". No caso das notícias de rádio, a forma da apresentação, configurada através da entoação, é ainda mais importante do que em outros formatos de rádio, pois é uma mensagem composta principalmente de dados, o que complica o processamento cognitivo do discurso

As características prosódicas desempenham um papel diferenciador entre diferentes partes do discurso informacional; eles distribuem a mensagem de rádio entre as informações conhecidas pelo ouvinte e, portanto, são menos notáveis, e entre o que é novo e o que, portanto, é o mais importante nas notícias. Como indica Hidalgo (1997), sua função fundamental é constituir um elemento significativo que relaciona expressão e conteúdo. Este trabalho é relevante não apenas do ponto de vista da produção prosódica, mas também do ângulo do destinatário.

Foi estabelecido que os grupos melódicos são de suma importância nas fases de perceção e processamento da cadeia sonora da fala nas sentenças, e que o ouvinte depende principalmente dessas (e possivelmente outras) unidades fonológicas para decodificar a fala. mensagem, e não na estrutura sintática das sentenças” (Sosa, 1999: 35).

Se os recursos prosódicos forem selecionados adequadamente, o ouvinte perceberá uma modificação acústica que indicará os momentos em que ele deve prestar mais atenção (Rodero, 2002). Por outro lado, se houver uma indiferenciação ou se esses recursos forem mal distribuídos, o destinatário poderá prestar mais atenção aos dados complementares e, portanto, perder as informações essenciais. Portanto, seria decisivo que os falantes em seus textos marcassem o conteúdo da mensagem em ordem de relevância - e, portanto, as informações conhecidas e desconhecidas - e, do mesmo modo, as palavras-chave de cada um dos grupos prosódicos. Dessa forma, os principais conceitos de informação, marcados com prosódia, seriam mais facilmente percebidos pelos ouvintes. Isso aumentaria a certeza do interlocutor de que o público entendeu a mensagem informativa e que, portanto, o objetivo final da comunicação foi atingido. Em suma, o locutor precisa dominar a configuração de entoação da mensagem se pretende alcançar o objetivo final dos ouvintes de entender e assimilar as informações.

Tendo em mente a importância decisiva da entoação nas informações de rádio, ao longo das páginas a seguir, tentaremos caracterizar os aspetos mais comuns da localização da indústria profissional por meio da revisão das principais pesquisas realizadas nesta área.

I. Monotonia ou cantilena da informação

Se existe uma tendência definidora da entoação que as emissoras de notícias costumam usar na rádio e na qual existe um consenso geral entre os pesquisadores, é a realização de um tipo de entoação circunflexa que produz acusticamente a sensação conhecida como "cantilena" informativa (Brasil, 1978; Tench, 1990; Taylor, 1993; Nihalani e Po Lin, 1998). Às vezes, para dar vivacidade a uma expressão, ênfase é dada quando não é pragmaticamente justificada e o discurso se torna o absurdo típico com o qual o falante marca indevidamente todos os finais de grupos fónicos como ascendentes ou com um padrão característico (por exemplo, ascendente-descendente). Os ouvintes o recebem com rejeição (Garrido, 1994: 188).

Ler as frases em vez de se concentrar no sentido é o [...] mais importante a maneira mais segura de desenvolver maneirismos vocais irritantes, como o baque de piledriving que alguns apresentadores de notícias conferem nas últimas palavras de cada frase, sejam importantes ou não importantes (Evans, 1977: 50).

Essa é uma tendência também detetada em outros idiomas: “Atualmente, é comum os leitores de notícias FM encerrarem uma frase ou um item de notícia com músicas em ascensão contínua, incluindo HRTs, em vez de uma música em queda, resultando em um efeito de 'lista'” (Price, 2005 : 3) Da mesma forma, a entoação circunflexa criticada consiste na reprodução constante de uma certa melodia por meio de uma sucessão de subidas e descidas tonais em intervalos quase regulares, independentemente da palavra pronunciada no momento. Em um estudo em inglês, Price (2005: 12) afirma: "A análise das músicas em ascensão mostrou que elas podem ser decompostas nos mesmos tipos de contorno em números muito semelhantes, se não idênticos". A regularidade, por sua vez, causa uma indiferenciação de conteúdo que, como tal, dificulta a compreensão do ouvinte. Price (2005: 307) o chama de "modelo geral de entoação" e o caracteriza como "um arroz agudo no tom mais alto do alcance de cada falante, seguido de uma queda na mesma palavra". Como indicado, no discurso da notícia é usado com uma função contínua. Assim, o público não possui elementos suficientes para reconhecer o que é importante do que é um acessório e para reconstruir a estrutura textual.

Esse contorno circunflexo na posição final pode ser analisado dentro da estrutura da fonologia métrica e autossegmentar como a combinação de um sotaque nuclear ascendente no qual o tom alto está alinhado com a sílaba tónica seguida por um tom de borda baixo que determina o fim descendente.

De acordo com os resultados de de-la-Mota e Rodero (2010), esse movimento para cima e para baixo pode ser descrito como um contorno melódico circunflexo que começa, para vozes masculinas, a 115 Hz em média, sobe para 175 Hz e desce até 105 Hz. Nas emissoras, inicia em uma média de 158 Hz, sobe para 224 Hz em média e cai para 161 Hz.

Neste estudo, após análise acústica das vozes dos editores de 24 boletins de rádio obtidos da RNE, Cadena SER, Cadena COPE e Onda Cero, foram registrados 110 casos de contornos circunflexos. Destes, 81% estavam na posição declarativa final. Observou-se uso frequente do contorno circunflexo no final das frases, em que são utilizadas várias unidades entoativas delimitadas com tons ascendentes ou sustentados fortemente marcados, mesmo separados por pausas. Importa ressaltar que sua aparência pode ser uma indicação para o ouvinte de que o fim de uma unidade temática e sintática ocorre antes da proliferação de unidades de entoação curta hierarquicamente menores e pode ser uma estratégia para indicar uma mudança de paradoxo ou macrounit paradoxal (Cfr Fox, 1973; Hidalgo, 2006). É o caso dos seguintes casos: “A pior parte dos protestos. Paco Pelegrín informa.” (COPE, 29/12/09, meio dia),“ Abaixo de 12.000 pontos. Bolsa de Madrid:” (COPE, 30-30-09, 18:00), “O processo de falência. Ele nos diz” (COPE, 4-1-10, 17h) e “O impacto no turismo. Hoje para hoje” (SER, 10-08-09, 10h). Os 21 casos restantes do corpus estudado destacavam elementos em foco estreito ou apareciam com menos frequência antes de subordinados ou parágrafos esclarecedores.

A partir do estudo do alinhamento do vale com o qual o acento bitonal começa e o pico correspondente ao tom alto do acento, conclui-se que em 87,27% dos casos analisados, o vale inicial era anterior ao início da sílaba acentuado, cerca de 30 ms, embora houvesse uma certa margem para sua localização (provavelmente devido ao contexto anterior). Examinados apenas os 89 contornos que apareceram na posição final, observou-se que o movimento ascendente começou em 29,74 ms em média. Não houve diferença significativa no comportamento dos contornos final e não final em termos do início da subida.

Junto com isso, foi detetado que o pico de f0 apareceu antes do final da vogal acentuada em 92 casos (83,64% do tempo). Dessa forma, levando em consideração o tempo entre o início da sílaba e o final da vogal, a percentagem de proximidade que a posição do pico em relação ao final da vogal pode ser calculada. Na maioria dos 92 casos, o pico foi de 29,2% da duração em relação ao final da vogal. Os 89 contornos que apareceram na posição final também mostraram o pico antes do limite da vogal em 85,39% dos casos. A distância do pico até ao final da vogal não diminui.

Ele não distinguiu os contornos circunflexos final e não final.

A análise dos contornos finais também indicou que a posição do pico dependia mais da posição do limite da vogal do que da existência de uma coda de sílaba. Nos casos em que não havia coda (52), o pico era de uma média de 35,89 ms antes do final da vogal que fecha a sílaba. Dos 10 casos que apresentaram coda surda, apenas um (produzido com alta taxa de elocução) apresentou o pico na sílaba seguinte. Nos outros, o pico apareceu antes do término da vogal. Os 27 casos com coda sonora apresentaram o pico 30,68 ms antes do final da vogal estressada e 98,57 ms do limite silábico. 70,37% deles apresentaram o pico antes do final da vogal.

O uso do contorno nuclear circunflexo em sentenças declarativas é considerado frequente e típico de programas de informação de rádio e televisão (Seco, 1990; Casado Velarde, 1995), embora alguns autores o considerem contraproducente, seja em um meio ou em outro.

Eles geralmente ignoram os princípios da segmentação de texto, aplicando entoação inconsistente com os sinais de pontuação contidos no texto lido. Apenas essas três características do estilo de declaração de reportagem preveem que os telespectadores terão problemas em entender o significado adequado das notícias (Francuz, 2010: 74).

De fato, outras pesquisas aplicadas aos noticiários de televisão também mostraram que a grande maioria das combinações tonais usadas pelos apresentadores de noticiários de televisão, no início, no meio e no final de suas frases, apresentava entoação circunflexa (Rodero, 2006).

Esse contexto está documentado em espanhol peninsular em posição nuclear em sentenças de diferentes tipos e em diferentes dialetos (Prieto e Rosseano, no prelo), embora seu uso em declarativos pareça ser mais limitado, ocorrendo no elemento aprimorado de sentenças com foco estreito (Cf. de-la-Mota, 1995; Face, 2002; Estebas Vilaplana e Prieto, 2008).

Além das características mencionadas, a análise da entoação por rádio também revelou uma tendência a reforçar a última parte da configuração tonal que precede as junções internas (por exemplo, entre sujeito e verbo, ou após um complemento na posição inicial de frase). Essas são articulações apropriadas ao conteúdo e à estrutura do texto em que é executado (dependendo do contorno da articulação) ou um aumento acentuado do tom ou um alongamento acentuado do tom de demarcação sustentado.

Por exemplo, "O primeiro vice-prefeito de Palma" (Onda Cero, 10-08-09, 10 h) ocorre com um aumento progressivo (aumento de continuação) em direção a um tom muito agudo da atitude do orador. Da mesma forma, em “E como avançamos uma hora atrás, a autópsia já começou. (RNE, 10-08-09, 12h), a configuração nuclear dá origem a um tom sustentado particularmente longo (pitch sustentado). Enquanto a vogal tónica [ou] dura 68 milissegundos, a vogal [a] do ditongo final - que normalmente já está em uma posição propícia ao alongamento - chega a 125. Essas estratégias, embora possam ser percebidas como exageradas, contribuem para refletir a estrutura da mensagem de rádio.

III - Na busca de ênfase constante

Tanto o aprimoramento dos acentos primários quanto a ênfase excessiva e o uso de marcas pronunciadas para destacar a presença de junções entre unidades de entoação são características que definem o estilo de apresentação das informações de rádio. São estratégias que aumentam o sentimento repetitivo de ênfase e a reprodução, portanto, da cantina peculiar. Price caracteriza essa tendência enfática na rádio como "o uso de hiperacentuação e uma faixa de tom exagerada, resultando no uso excessivo de destaque local" (Price, 2005: 308). Da mesma opinião é Van Leeuwen:

Eu acho que os locutores, em geral, costumam fazer com que tudo o que eles digam pareça importante, independentemente de ser em sentido real ou por qualquer outro motivo que não seja ouvido por um número muito grande de pessoas (Van Leeuwen, 1984: 84)

Mas a medida não excede e as recomendações de Tubau seguem nesta direção:

Fazer sentido é entender o que está sendo lido, pensar no significado do que está sendo dito e garantir que isso seja claro para quem o ouve. Devemos sublinhar certas palavras no texto, mas sem exageros. Tornar quase todas as palavras significativas é como não destacar nenhuma (Tubau, 1993: 52).

Os principais usos relacionados com a ênfase acentuada serão descritos abaixo. Primeiro, o estresse excessivo leva à criação de sotaques secundários em sílabas nas quais lexicalmente não existia. É o caso de exemplos como os seguintes, todos provenientes de boletins de rádio: “Das agências de viagens alemãs”, Onda Cero, 08-08-09, 19h), “Dez dias atrás em Palmanova” (Onda Cero, 10 -08-09, 10h), “São dados que fornecem estatísticas” (RNE, 10-08-09, 12h), “Nos quais eles criticam as alterações na ajuda automática para favorecer” (RNE, 10-08-09, 12h), “Por parte da Polícia” (Cadena Ser, 10-08-09, 10h) e “Dobrar os controlos” (Cadena Ser, 10-08-09, 10h).

De acordo com os resultados de Belda e de-la-Mota (2010), o conhecido fenómeno da acentuação excessiva, por ser conhecido e marcante, não é tão comum na leitura de notícias quanto outros fenómenos que afetam a acentuação. como o aprimoramento do sotaque primário, que pode ser verificado no exemplo a seguir: “Receita do Modo em que o executivo” (RNE, 7-09-09, 11h). De fato, após a análise de quinze boletins de notícias da Rádio Nacional Espanhola, foram isolados 43 exemplos de palavras com sotaque pós-tóxico, enquanto nos dez primeiros boletins da amostra foram produzidos até 137 casos de aprimoramento de sotaque primário. Após verificar as produções de um total de 30 palestrantes, verificou-se que 19 deles não produziram nenhum caso de estresse excessivo em um total de 14 minutos e 20 segundos.

De qualquer forma, essa maneira de oralizar os textos marcando um acento em posições inicialmente inapropriadas e enfatizando continuamente os acentos pode ser entendida como uma redução das nuances de entoação que o locutor imprime nas notícias: “Para um radiodifusor usar apenas 'ênfase' seria como pintar apenas em preto e branco. A entoação, na verdade, oferece uma paleta inteira de cores para misturar e usar em muitos tons diferentes e sutis para aprimorar o significado” (Mills, 2004: 125-126).

No pólo oposto, no entanto, outra particularidade detetada é a atenuação excessiva de acentos de palavras relevantes, que apenas realçam o acento de frase melódica, que é a da última sílaba tónica do grupo de entoação, como no exemplo de Garrido (1994: 188): "Não somos enganados" em vez de "NÃO somos trapaceados. Por motivos de conteúdo, seria conveniente manter o primeiro sotaque.

Uma das consequências mais óbvias causadas por essa maneira de acentuar tão característica do ambiente em que muitos elementos recebem um reforço acentuado é a segmentação excessiva dos grupos. A pronúncia continuada de grupos de sotaque em diferentes unidades de entoação causa a sensação acústica de que a fala é interrompida, uma vez que as unidades são formadas, repetidamente, por algumas sílabas (de-la-Mota e Rodero, 2010). Essa prática, portanto, tem uma consequência direta na perceção do ouvinte e em seu grau de entendimento, se considerarmos a seguinte apreciação de Aguilar et alii.

Certos agrupamentos de palavras não suportam a presença de pausa em sua pronúncia. O silêncio não deve aparecer atrás de uma palavra não estressada, nem entre elementos com um alto grau de coesão sintática e semântica. No entanto, nos discursos dos meios de comunicação, encontramos numerosos casos em que essa restrição é violada” (Aguilar et al, 2000: 103).

Essa é uma tendência também observada na análise de Rodero e Campos (2005). Os apresentadores segmentaram excessivamente os grupos, produzindo em muitos casos uma quebra no significado da mensagem. Especificamente, nesta investigação, verificou-se que os apresentadores separavam uma média de vinte por cento das unidades sintáticas que se esperaria que coincidissem com os grupos fónicos, até juntando-se àqueles que são divididos por um período na redação.

Uma possível explicação para o uso desse estilo prosódico na apresentação de notícias pode ser devido à falta de habilidade dos jornalistas quando se trata de usar recursos prosódicos, embora a razão subjacente esteja na intenção executiva de enfatizar muitas partes do texto (Aguilar et al, 2002; Strangert, 2005) com o objetivo de capturar e manter a atenção do ouvinte (Price, 2005). Já para Wheatley (1949: 213), a fala na rádio é caracterizada por uma ondulação tonal sem sentido ou por padrões de tons usados ​​indevidamente que talvez surjam do desejo de acentuar a expressão da fala. Porém, longe de alcançar esse resultado, o uso desse estilo prosódico produz vários efeitos; envolve uma modificação dos valores atribuídos em outras situações de fala ao sistema de organização acentuada e envolve uma reação indesejada entre o público.

IV - Efeitos na perceção de ouvir

Os livros no estilo de rádio e televisão coletam sucintamente esses recursos prosódicos como defeitos que devem ser evitados. Entre eles, o Telemadrid Style Book descreve entre os “vícios” mais frequentes a queda, a tolice, o absurdo, a monotonia e a afetação, e presta atenção especial à “desagradável modulação da voz no final das palavras ou as frases" e "a repetição constante do mesmo movimento de entoação". Também no Livro de Estilo do Canal do Sul, é indicado que “a monotonia, a falta de cadência, os sonsonetes e as deslocações acentuadas causam confusão” e não são apropriados ao discurso jornalístico, “cujas principais características são naturalidade e clareza”. Por fim, o Guia de Estilo de Onda Zero recomenda que "se evite a leitura monocromática e repetitiva".

É a previsibilidade do padrão vocal que se torna entediante. Uma frase "forma" muito típica começa em um tom baixo, sobe rapidamente para o topo e desce gradualmente, chegando ao fundo novamente pelo ponto final. (...) Tais sentenças (...) confundem porque, com o início e o final na mesma "nota", as junções dificilmente são percetíveis (McLeish, 1986: 107).

De fato, em duas das pesquisas sobre prosódia realizadas em informações de rádio (Rodero, 2007) em que uma avaliação qualitativa foi solicitada a uma amostra de ouvintes, essas práticas foram avaliadas negativamente pela qualificação da entoação circunflexa como: “um tipo de entoação que não é grave, cantada, como uma proclamação, é uma canção, um monocórdico, um tolo, é ridículo.” Em segundo lugar, eles descreveram a acentuação enfática como "exagerada, antinatural, desequilibrada e causando perda de significado". Diante dessas práticas, os sujeitos optaram por um tipo de entoação mais natural, que cumpria as funções linguísticas e modificava os níveis tonais de acordo com a função sintática e informativa da fala e a intenção comunicativa do falante.

O problema é que o uso repetitivo de estratégias enfáticas e padrões de entoação, além de desagradável, pode ser problemático. Nesse sentido, Garrido (1994: 188) é pronunciado quando indica que os ouvintes o julgam com rejeição. É assim, alerta, porque "eles não servem para identificar o tipo de grupo fónico dentro de seu padrão de entoação" (de-la-Mota e Rodero, 2010), ou seja, porque finalmente afetam o grau de entendimento.

Nesse sentido, tanto a literatura sobre apresentação verbal na rádio quanto alguns estudos experimentais concordam que existem duas qualidades que determinam uma entoação adequada: naturalidade e dinamismo adequado. Por um lado, a naturalidade, como aquela característica do discurso que tenta reproduzir as condições de uma conversa interpessoal com o objetivo de obter empatia com o ouvinte. Assim, Guevara e Castarlenas consideram que “o discurso moderno sempre tende a ser muito natural e simples, tanto na expressão como na projeção em qualquer uma das diferentes facetas ou campos em que trabalharemos” (1984: 86). Juntamente com esses achados, no estudo experimental realizado por Rodero (2007), os ouvintes da amostra optaram por um tipo de entoação natural porque, caso contrário, o conteúdo da mensagem perde-se, afastando-se do entendimento ideal.

Juntamente com a naturalidade, a segunda qualidade mais destacada é o dinamismo, como uma característica que visa principalmente atrair a atenção do ouvinte e facilitar o entendimento da mensagem. Assim, para Huertas e Perona (1999: 116), a coisa apreciável "não é a periodicidade matemática adequada, mas precisamente o elemento que quebra a regularidade do evento sonoro esperado".

O locutor corre o risco de perder seus ouvintes se ele não conseguir um contraste prosódico adequado por meio de variações melódicas: “Esses recursos também fazem parte do discurso australiano comum, mas nas notícias eles são mais frequentes e extremos, sem dúvida porque o tempo está chegando. limitada e a concorrência pela atenção do público é feroz” (Price, 2005).

Por esse motivo, vários estudos apontam a monotonia como um dos principais problemas da apresentação de rádio (Glass, 1994; Knapp, 1982).

Se o falante não possui expressão e musicalidade, o ouvinte vinga-se da maneira mais simples: pressiona o botão do recetor. O locutor perde sua audiência se negligenciar o tom melódico, que deve aumentar e diminuir, se esquecer as mudanças atraentes - rápidas e lentas -, a voz é alta e quieta e usa a afirmação sem pausas ou dinamismo (Arnheim, 1980: 28 -29).

Mas, como discutimos, além da atenção, uma entoação monótona afeta o entendimento da mensagem. Nesse sentido, Bolinger (1989) provou que causa uma perda de inteligibilidade. Em resumo, por essas razões, a entoação deve tender a ser o mais natural e dinâmica possível, a fim de favorecer o cumprimento dos objetivos comunicativos. Isso significa que, em última análise, deve-se evitar a repetição regular e injustificada de padrões acentuados e de entoação e, consequentemente, os consequentes efeitos que eles causam.

V. Conclusões

A entoação, juntamente com outras características linguísticas e não linguísticas, desempenha uma função de índice social, pois existe uma maneira peculiar de falar que permite identificar a variante estilística profissional de padres, advogados ou emissoras de rádio. Na reportagem isso caracteriza-se por uma uniformidade e regularidade acentuadas dos recursos tonais, que predomina, por um lado, o aprimoramento acentuado enfático dos acentos primários e das palavras funcionais, a acentuação excessiva e a realização enfática das articulações e, por outro, a repetição de padrões de entoação e o uso de um contorno circunflexo delimitador. Como esses fenómenos ocorrem independentemente da estação de rádio analisada e do sexo das emissoras e são comuns em vários idiomas, é demonstrado que existe um estilo particular de contar as notícias na rádio.

Grande parte da melodia peculiar atribuída ao noticiário é produzida pelo uso frequente de estratégias que geram ênfase recorrente, provavelmente devido à necessidade de manter a atenção do ouvinte viva. Dado o aparecimento frequente do contorno circunflexo em contextos de fechamento, vale a pena perguntar até que ponto e em que contextos o uso desse contorno para delimitar unidades menores com valor de continuação é ou não eficaz do ponto de vista comunicativo. Nesse sentido, pode-se esperar que emissoras experientes usem de maneira mais eficiente as estratégias prosódicas para capturar e manter a atenção do público e facilitar a decodificação da estrutura linguística da mensagem sem cair na monotonia. O locutor de rádio deve reforçar com a escolha dos tons o significado dos dados que ele explica (para notícias mais sérias, tons mais graves; informações mais alegres, níveis agudos), distinguir com esses níveis os elementos novos ou conhecidos do discurso e obtenha o contraste acústico certo, capaz de reivindicar e manter a atenção do ouvinte para atingir o objetivo final de estabelecer uma comunicação eficaz.

A leitura de notícias na rádio envolve o uso de um código entonativo profissional, caracterizado pela busca de imparcialidade e assertividade em um meio em que a novidade já é pressuposta (van Leeuwen, 1984). O Manual de Estilo RTVE para repórteres de rádio (1980: 83) insiste na transmissão da imparcialidade, que "também afeta, e às vezes principalmente, a entoação ao ler uma história". O esforço dos profissionais da leitura, que resulta da necessidade persistente de recriar uma voz assertiva, clara, viva e imparcial em todos os momentos, pode ser a causa do resultado se tornar antinatural e até irritante para o ouvinte:

Uma possibilidade que também pode ser considerada e que já foi sugerida (Barber, 2000) é que há uma mudança linguística que afeta, entre outros aspectos, a maneira pela qual o sotaque e a entoação são usados ​​para marcar os contrastes e ênfase Dada a sua influência e alcance demográfico, a meios de comunicação estaria se comportando, nesse caso, como plataformas de difusão para a mudança.

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Van Leeuwen, T. (1984): “Discurso Imparcial: Observações sobre a Entoação do Leitor de Notícias de Rádio”. Australian Journal Cultural Studies 2 (1): 84-98.

Tradução e adaptação

Rui de Melo

 

Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de Salamanca

e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto

 

 

Exercícios de dicção

 Cada texto deve ser lido calmamente. Primeiro é preciso dizer correctamente aquilo que se lê. Num segundo momento, depois de já se ler o texto com alguma segurança, deve-se tentar dar a entoação e o ritmo que parecerem mais adequados para cada texto.




B

À boca de um beco
na bica do Belo
Um bravo cadelo
berrava: bau, bau.

Um bêbado, um botas
de bolsa e rabicho,
embirrava com o bicho,
bateu-lhe com um pau.

Foi grande a balbúrdia,
a turba ria,
o bruto bramia,
e o broma a bater.

Com o pau sobre o pobre,
e bumba e mais bumba,
parece um zambumba.
Bendito beber.


C

Na toca de uma coruja
numa casa escangalhada
corria de canto a canto
certa cobrinha cintada.

Encontra um pinto calçudo
que por ali andava à caça
das moscas e sevandijas
e que ao ver a cobra embaça.

"Comadre", diz o coitado
lá no seu queriquiqui,
"vem caçar? Eu já cacei.
Entre que eu saio daqui".

Torna a cabeça escancarando
a boca: "caçaste? E eu não.
Mas ambos temos faxina,
compadre do coração..."


D

Um doido destes de pedras,
por nome Andrónico André,
Casado com dona Aldonça,
Que em vez de dois, tinha um pé.

Dia de corpo de Deus,
disse à esposa: "Aldonça, andai
adornai com as gualdrapas,
que herdei de Adão meu padrasto".

"Dai-me a capa de bedel,
o casaco de mandil,
o meu chapéu de dedal,
e a bengala d´aguazil."

"Gravata dura (que é duplex),
meu relógio de cadeia.
O meio-dia oiço dar!
Põe-me já depressa a ceia."

"Venha o pudim de bedum,
que a dona Dulce nos deu,
e o presunto quadrilongo,
do quadrúpede sandeu."

E assim ceado a asseado.
O tal Andrónico André,
saracoteando os quadris,
Cantava ai que bom que bom que é.

F

Florência, Francisca, Eufrásia,
todas de fraldas de folhos,
foram fazer uma festa
de filhós, bifes, repolhos.

Três tafuis, três franchinotes,
deitaram-lhes fel nos molhos,
por tal feito que as três,
fartas de fome e de zanga,
só comeram dessa vez,
fígados fritos de franga.


G

Eugénio Gomes da Gama
e Gil Gonçalves Bugio
brigaram num desafio
pela grulha de uma dama.

Grande desgraça e muito digna
de lágrimas bem gerais!
Seus golpes foram mortais,
e aquela magana indigna
mangou nos seus funerais.


J

Um janízaro em jejum
viu num jardim um jarreta,
que estava a jantar peru,
gergelim e ginja preta.

De júbilo encheu-se todo,
e pregou-lhe uma peta
que tirou o pé do lodo
e gamou tudo ao jarreta.


L

Pondo loja de capela,
Pantaleão do Cardeal,
alardeia o que tem nela,
pregando-lhe um edital:

"linhas, lonas, alfinetes,
lamparinas, chalés, luvas,
lenços, lâmpadas, colchetes,
leques, luto de viúvas.

Lustres, lacre, lã, palitos,
ferrolhos, lápis, lanternas,
papel, galões, passarinhos,
ligas de enlaçar as pernas!"

Com esta longa parlanda,
o feliz Pantaleão
já tem pilhado um milhão
e vai comprar a outra banda.


M

Amaro Simão de Sousa
tem mendiga muito fatal:
semeando qualquer coisa,
jamais lhe nasce outra igual.

Suponhamos que semeia
mostarda ou manjericão:
vem-lhe malvas, vem-lhe aveia,
ou melancia ou melão.

Malmequeres dão-lhe amoras,
amoras dão-lhe marmelos:
marmelos criam-lhe esporas,
e estas moncos amarelos.

Teima e afirma muita gente
de moleirinha machucha
que esta mendiga indecente
foi manobra de uma bruxa.


P

Pedro Paulo Pinto Pereira,
pobre pintor português,
pinta portas paredes e painéis,
por preços populares,
para poder partir para Paris,
pois pode praticar Ping-Pong,
que é desporto parco,
mas de prática particularmente preversa.


Comprei um pinto em prata
(que não há preço mais módico)
uma pipa uma pata,
um pote, um pente, um periódico.

Depois pus tudo isto à venda,
que parvo negócio fiz!
um rapaz moço de tenda
prometeu-me uma de xis.



Q

Quem há que queira comprar
em Queluz um bom quintal?
No Verão é muito quente;
no Inverno tal e qual.

Tem quinze árvores de quina,
quarenta cardos de coalho,
quatro flores de quaresma
que não requerem trabalho.

Dá três alqueire e Quarta
de quássia e doze de milho,
e do líquido que esquenta:
seis quartolas e um quarlilho.

Qualquer pessoa querendo ver
este prédio esquisito
pode falar com o quinteiro
Quirino Joaquim Cabrito.


Que eco que há aqui!
Que eco é?
É o eco que há aqui.
O quê, há eco aqui?!
Há eco, há.


R

Comprei na feira do Rato,
no largo das amoreiras,
arroz de peru num prato
arranjado pelas freiras.

Sabia a chouriço moiro;
era comer e gritar!
Carne, rins, recheio coiro,
roí sem resto deixar.

Porém, fiquei muito doente,
tanto que o doutor Cabral
me receitou para o ventre
raspas de unicórnio e tal.


Um rato roendo roía
o rabo do rodovalho
e a Rosa Rita Ramalho
de o ver roer se ria.


O rato roeu a rolha da real garrafa
do rei da Rússia.
O Borges relojoeiro ruminara
roendo raspas de raiz de romãzeira.
O tambor rufará rápido:
três rufos e seis batidas,
para o remador desamarrar rente o remo
e remar contra a corrente.
O doutor receitou remédios drásticos:
três colheres de óleo de rícino
e raspas de rosa rara.
O livro raro traz trais trechos
que rapidamente se o rasga.


S

Nasce-se, cresce-se, desce-se...
os senhores as senhoras...
os senadores as senadoras...

Se os seis sábios são susceptíveis,
seguramente sereis satisfeito.

Céus! se Cecília sabe,
seus sentimentos serão sempre sinceros.

Os assassinos sobre seus seios
sugavam sangue sem cessar.


Susana! Se saíres sai só.
Sou o sempre seu
Serafim Sá de Sousa.


S (z)

Um rapaz tendo uma Zebra
metida num casarão,
desancou-lhe um dia a febra
que a pôs magra como um cão.

A azêmola era cinzenta,
e, depois daquela tosa,
ficou da cor da pimenta
e a atirar para fanhosa.


T

Triste trolha atrapalhado
de taipar tanta trapeira,
consertar tanto telhado,
estragar tanta goteira.

Na festa de Santo Entrudo
entra trôpego e zoupeiro,
de tamancos, tosco e rude,
no interior do seu palheiro.

Sentou-se num tamborete,
sem dizer nem chus nem bus
e pôs-se a entrudar sozinho
com tripas de atum de truz.


Eis trinta cães famintos
(outros dizem trinta e seis)
entram de tropel ladrando.
Que estrago!... Agora o vereis.

Trastes, trancas, tocos, troncos,
estoiram...tudo é tropel.
Bater, latir, tombos, roncos
terminam este aranzel.


V

Vinde ouvir caros ouvintes.
Vale a pena!
Era uma vez Vitorino Vaz Ventura
dos Arcos de Valdevez.

Vai ele um dia e vestiu-se
com a véstia verde-gris,
luva nova cor de couve
e verónica de Aviz.

Adivinhais o motivo
porque assim se ataviou?
É porque ia a Vila Verde
à voda do pai-avô.

- Como vens viçoso e grave!
Diz o pai-avô.
- Trago-vos trovas em verso,
lhe volve o vivo camelo.

E tais trovas e tais versos
dum livro lhe vomitou
que virou de uma vez o bucho
ao ciso do pai-avô.


X

Excelente chá da China
em caixotes de charão
trouxe a charrua xarroco,
que é xaveco de feição.

Além deste chá de luxo,
mil coisas muito curiosas
trouxe da China. Por exemplo
Chambres roxos, seda fina.

Chibatas e chifarotes,
lenços para chischisbéus,
Chorinas de franchinotes,
frascos de óleo de xaréus.

Xargões, enxergas, enchovas,
enxofre, enxós, chocolate,
enxúdias, enxertos, lixas,
lagartixas e um orate.

Xavier consignatário,
chineiro gordo e convexo,
vendo tanta esquisitice
dizem que ficou perplexo.


TESTE A DICÇÃO!

FÁCIL

1. Xuxa! A Sasha fez xixi no chão da sala.
2. O rato roeu a roupa do rei de Roma; a rainha com raiva resolveu remendar.
3. Três pratos de trigo para três tigres tristes.
4. O original nunca se desoriginou e nem nunca se desoriginalizará.
5. Qual é o doce que é mais doce que o doce de batata doce? Respondi que o doce que é mais doce que o doce de batata doce é o doce que é feito com o doce do doce de batata doce.

MÉDIO

1. Sabendo o que sei e sabendo o que sabes e o que não sabes e o que não sabemos, ambos saberemos se somos sábios, sabidos ou simplesmente saberemos se somos sabedores.
2. O tempo perguntou pro tempo qual é o tempo que o tempo tem. O tempo respondeu pro tempo que não tem tempo pra dizer pro tempo que o tempo do tempo é o tempo que o tempo tem.
3. Embaixo da pia tem um pinto que pia, quanto mais a pia pinga mais o pinto pia!
4. A sábia não sabia que o sábio sabia que o sabiá sabia que o sábio não sabia que o sabiá não sabia que a sábia não sabia que o sabiá sabia assobiar.

DIFÍCIL

1. Num ninho de mafagafos, cinco mafagafinhos há! Quem os desmafagafizar, um bom desmafagafizador será.
2. O desinquivincavacador das caravelarias desinquivincavacaria as cavidades que deveriam ser desinquivincavacadas.
3. Perlustrando patética petição produzida pela postulante, prevemos possibilidade para pervencê-la porquanto perecem pressupostos primários permissíveis para propugnar pelo presente pleito pois prejulgamos pugna pretárita perfeitíssima.
4. Não confunda ornitorrinco com otorrinolaringologista, ornitorrinco com ornitologista, ornitologista com otorrinolaringologista, porque ornitorrinco, é ornitorrinco, ornitologista, é ornitologista, e otorrinolaringologista é otorrinolaringologista.
5. Disseram que na minha rua tem paralelepípedo feito de paralelogramos. Seis paralelogramos tem um paralelepípedo. Mil paralelepípedos tem uma paralelepipedovia. Uma paralelepipedovia tem mil paralelogramos. Então uma paralelepipedovia é uma paralelogramolândia?



Rui de Melo

Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de Salamanca

e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto


Reflexões vertidas para aulas


Fonte

https://teiaportuguesa.tripod.com/manual/travalinguas2.h

As Qualidades do Bom criador de Reportagens em Rádio

 As Qualidades do Bom criador de Reportagens em Rádio


Reflexões vertidas para aulas por
Rui de Melo
Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de Salamanca e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto
Professor Associado, aposentado, da Universidade Fernando Pessoa 
Com base em artigo da professora Susana Herrera Damas, publicado na Revista RE - presentaciones Periodismo, Comunicación y Sociedad. sherrera@udep.edu.pe
Embora por razões de tempo e recursos não esteja muito alargado na prática, a reportagem é um género que tem um grande potencial e que oferece abundantes possibilidades para a sua exploração na rádio. A razão: a sua capacidade para oferecer uma maior profundidade na altura de relatar os factos, interpretá-los, contextualizá-los, oferecer um maior relevo e situar a informação numa perspectiva mais ampla. Contudo, nem sempre é fácil elaborá-las. É verdade que é um género que deixa certa margem à liberdade expressiva do seu autor (1). Mas, por isso mesmo, a ausência de moldes prefixados gera por vezes incerteza sobre o modo de proceder. O objectivo deste artigo é descrever algumas das qualidades mais importantes que podem ajudar o repórter no desempenho do seu labor. Antes, descreveremos brevemente a essência deste género a partir do retrato dos seus sinais de identidade mais significativos.
2. Características da reportagem em rádio
A reportagem é um “modelo de representação da realidade que a partir do monólogo radiofónico pretende narrar e descrever factos e acções de interesse para o ouvinte, proporcionando um contexto de interpretação amplo nos conteúdos e no uso de fontes; rico e variado nos recursos de produção, e cuidado e criativo na construção estética do relato” (Martínez-Costa e Díez Unzueta, 2005: 114). Esta definição formal poderia ficar completada com outros traços que também identificam o género.
Quanto ao seu conteúdo, a reportagem caracteriza-se pela sua atitude informativa, por ter certa conexão com a actualidade, pelo seu carácter narrativo descritivo e por uma maior profundidade jornalística que não se conforma com descrever e narrar os elementos mais noticiosos de um facto, mas também trata sempre de ir mais além. Assim, a reportagem é um género que se inspira em factos reais e concretos e que admite uma alta versatilidade temática.
Quanto aos seus recursos estilísticos, relativos à expressividade e ao pôr em cena, a reportagem define-se como uma alta intensificação dos recursos expressivos e um uso de fontes rico e variado nos recursos de produção e cuidado criativo na sua construção estética. Desta forma, o repórter participa no texto e tem liberdade para estruturar o seu relato, escolher a linguagem e para fazer um uso intencional de todas as possibilidades expressivas que a técnica e a linguagem radiofónica oferecem. Outros traços são a sua originalidade, o seu estilo pessoal, a sua grande liberdade estrutural, a diversidade de recursos expressivos que admite e o monólogo para a sua apresentação.
Quanto às suas condições de produção, são características da reportagem a sua emissão habitual em diferido e desde a emissora e a sua extensão variável que pode ir desde os 2 ou 3 minutos das reportagens elementares até às reportagens de investigação, muito mais profundas e cuja extensão pode chegar até aos 60 minutos.
Finalmente, quanto ao lugar do género dentro do conjunto de programas que compõem a oferta de uma emissora, a reportagem tem uma ligação informativa e encontra-se nos serviços principais de notícias ou nos noticiários especiais. Por vezes, pode chegar também a constituir programas autónomos.
3. Os tipos de reportagem em rádio
Por sua vez, nem todas as reportagens são iguais. Na prática, é possível classificá-las a partir de diferentes critérios. Numa tipologia própria (Herrera, 2007e) importa distinguir diversos critérios, segundo se refiram às técnicas de realização, ao grau de profundidade, ao lugar de emissão e ao conteúdo. Segundo a técnica de realização, podemos distinguir as reportagens em directo, em diferido e mistas. Segundo o grau de profundidade, as reportagens podem ser elementares, documentais e de investigação, com um grau crescente de profundidade, conforme passamos de um a outro. Atendendo ao lugar de emissão, encontramos reportagens de rua, editadas em estúdio ou mistas. Finalmente, quanto ao conteúdo, as reportagens podem abordar factos, acções ou declarações, embora, na prática, estas modalidades não se costumem apresentar em estado puro mas também pode haver uma reportagem que comece relatando um facto e inclua depois uma série de declarações para fechar finalmente com a exposição das acções que se seguirão no futuro, em razão do facto em questão.
Não obstante, à margem do tipo de reportagem, a maior parte das qualidades que vamos descrever são, na realidade, válidas para toda a tipologia. Isto é, trata-se de qualidades que ajudam o repórter a desenvolver o seu trabalho, quer numa reportagem elementar ou de investigação, por exemplo. Juntamente com elas, há outras qualidades que são específicas de alguma modalidade concreta, como teremos ocasião de ver.
4. O estilo da reportagem em rádio
Antes, um par de notas breves sobre o estilo das reportagens em rádio e sobre as fases da sua elaboração. Quanto ao estilo, um dos traços característicos do género é a sua originalidade. Qualquer reportagem quer ser original, nova, inovadora, diferente, único e diferente. De alguma forma, qualquer reportagem quer ser recordada porque, antes dela, nunca se escutou algo assim. Na prática, esta originalidade alarga-se desde o fundo até - sobretudo - à forma que a reportagem adopte.
Quanto ao fundo, há reportagens que querem ser originais pelo tema que abordam, enquanto outras querem ser pela perspectiva ou ponto de vista que se adopte. Quanto à forma, a originalidade da reportagem nota-se sobretudo na redacção, no tipo de narrador que se use, nos tratamentos de tempo e espaço ou no ritmo (Herrera, 2007c). Na prática, esta originalidade exige certas qualidades expressivas por parte do repórter.
5. As fases na elaboração da reportagem em rádio
Quanto às fases de elaboração da reportagem em rádio, estas são o resultado de um processo laborioso que inclui: ideia, propósito, perspectiva, investigação, selecção, ponderação ou avaliação, elaboração e apresentação (Ulibarri, 1994: de 51-57 e Herrera, 2007d). Dizemos isto porque, em cada uma destas fases, o repórter deve empregar uma ou várias das qualidades que vamos descrever a seguir. Com toda esta apresentação preliminar, vamos ver agora quais são essas particularidades que ajudam o repórter a desenvolver o seu trabalho.
6. As qualidades do bom criador de reportagens em rádio
Uma vez descritos os principais aspectos da reportagem radiofónica, passamos agora a expor as principais qualidades de todo o bom criador de reportagens em rádio. Na realidade, falar destas qualidades daria lugar a uma enorme relação que, naturalmente, deixaria de fora o labor de muitos repórteres. Ao fim e ao cabo, a excelência profissional é um valor limite ao que todo repórter deve aspirar mas que, em muitas ocasiões, sobretudo devido à exigência laboral a que está submetido, será difícil de alcançar. Aos efeitos deste trabalho, e sem deixar sempre de animar os repórteres a que procurem fazer o seu trabalho com o máximo rigor possível, preferimos deter-nos só naqueles traços que definem especificamente o seu labor, isto é aquelas qualidades que lhes serão mais necessárias e úteis ao enfrentar o seu trabalho.
Neste ponto, vamos empregar a resposta que Sánchez Sánchez (2000: 161-175) dá à pergunta sobre as qualidades que deve reunir um estudante de Jornalismo, um bom jornalista ou qualquer comunicador. De entre todas as formulações que se fizeram neste ponto até à data[1], consideramos que esta é a proposta mais sugestiva, simples e ao mesmo tempo completa de quantas analisámos. Por muito que leiamos sobre as qualidades que um bom profissional da informação deve ter, cremos que a sua apresentação, além de estar muito bem exposta, tem o indubitável mérito de voltar à essência, ao núcleo, ao coração e à alma do que é um bom jornalista.
Em palavras de Sánchez Sánchez, o bom comunicador não é aquele que domina umas técnicas ou destrezas mais ou menos mecânicas, mas quem é capaz de saber ver, escutar, pensar e expressar aquilo que viu, ouviu e pensou. E acrescenta uma qualidade mais:
“O bom comunicador é aquele que tem um conhecimento profundo do que é o homem e do mundo que o rodeia. Algo que não se pode resumir numa mera cultura superficial, no sentido mais usado da palavra: é verdadeira cultura, não erudição” (Sánchez Sánchez, 2000: 161-162).
Se estas exigências afectam qualquer comunicador são ainda mais necessárias no caso do repórter, já que os seus textos se caracterizam, entre outros, por um afã de aprofundar e consolidar mais o conhecimento de uns factos para expor a sua verdadeira natureza e para revelar os seus significados mais ocultos. Vamos ver o que significa na prática cada um destes cinco requisitos.
6.1. Saber ver
No desempenho do seu trabalho, é muito importante que o repórter saiba ver, saiba aproximar-se do mundo com curiosidade e interesse e, procedendo assim, tome consciência do que são as coisas:
“O que pensa que já sabe tudo, o que está de passagem, não é capaz de ver nada, de escutar nada, de pensar nada nem de contar nada que verdadeiramente valha a pena. Só saberá falar da sua própria suficiência. Só o que sabe passear com calma, fixando-se nas coisas, nos detalhes, o que desfruta com aparente simplicidade, o que lê por ler, aprende aquela lição: “As coisas são complexas - disse um professor -, bastaria que aprendessem isso”” (Sánchez Sánchez, 2000: 164).
Saber ver, saber observar e saber dar conta é fundamental na altura de redigir reportagens para rádio. Ao contrário do repórter medíocre que é aquele que “só sabe ver o que já viram centenas de vezes, em situações parecidas, utilizando a mesma receita para descrever desfiles, acontecimentos desportivos e festas folclóricas” (Arnheim, 1980: 130), o bom repórter é um curioso que se questiona sempre sobre o porquê das coisas:
“A curiosidade é, de entrada, o desejo de saber, de conhecer as coisas que nos rodeiam e de poder explicá-las racionalmente (…) é a condição de possibilidade do estudo, embora, para poder levar este a cabo, é preciso, além de curiosidade, uma boa dose de constância. O profissional curioso não se contenta com uma resposta simples, mas também mergulha nas coisas com o fim de conhecer porque são, como são e porque funcionam como funcionam” (Torralba, 2002: 296).
Mais que em outros géneros, na reportagem, essa curiosidade e esse afã de ir mais além é chave, porquanto a profundidade é um traço nuclear do género. Isto é, a reportagem não se limita a descrever e narrar os elementos mais noticiosos de um facto mas também, uma vez conhecidos estes, trata de proporcionar uma maior profundidade (Herrera, 2007a).
Isto consegue-se graças à investigação e é o que permite interpretar os factos, contextualizá-los, oferecer um maior relevo e situar a informação numa perspectiva maior. Neste sentido, Martín Vivaldi (1987: 108) afirma, sobretudo da grande reportagem, que deve ser reveladora. Para Lewis, o repórter tem uma exigência maior que a do redactor de notícias:
“A responsabilidade do repórter não é simplesmente dizer “isto sucedeu”, mas “isto sucedeu e assim foi como sucedeu, por isto sucedeu, e estas são as perguntas que permanecem sem resposta”. Para este tipo de jornalismo, o repórter deve ler muito, ser inteligente, reflexivo e céptico. Deve imprimir a sua inteligência sobre o material retocado, e dar-lhe forma e ordem, ainda quando o evento mesmo ofereça só um montão de ideias caóticas e meras impressões” (Lewis, 1994: 95-96)
Neste sentido, o afã do repórter é sempre dar respostas à maior quantidade de perguntas. O bom repórter, sabe, como diz Sancho, que já não basta responder aos tradicionais 5 W´s:
“ (O repórter) sabe que, no jornalismo de hoje, os clássicos 5 W”s (What, Who, When, Where & Why; em Português que, quem, quando, onde e porquê) não ficaram obsoletas mas sim superadas e enriquecidas com mais perguntas perante as quais o leitor necessita respostas: para quê, a quem afecta, quem o promove e porquê, quais seriam as consequências, que posso fazer eu, como o fizeram, como o faremos aqui, quem está interessado, a quem beneficia… e assim num esmiuçar que, de modo específico, desmonta cada informação” (Sancho, 2004: 60).
No repórter, esse saber ver será fundamental para discernir o que um facto tem de estranho, uma acção de diferente e para saber intuir também o cariz que tem uma determinada declaração. Além disso, embora dependa muito do tipo de repórter, em geral, esse “saber ver” está muito condicionado ao que previamente conheça do tema: só quando tenha um grande conhecimento sobre um assunto poderá captar com maior facilidade o que tem de novo, inédito ou diferente. Por isso, seria muito desejável que esse saber ver incluísse também um conhecimento profundo do tema - tanto nos seus aspectos mais gerais e conhecidos como nos mais particulares e desconhecidos -, assim como um trabalho completo de documentação. Estas duas tarefas darão respostas a perguntas sobre acontecimentos similares em outro momento ou lugar e servirão também para chegar ao fundo de todas aquelas questões que têm alguma relação com a reportagem. Nas variantes mais sofisticadas da reportagem de investigação, será útil também que o repórter esteja alfabetizado informaticamente já que são cada vez mais as reportagens que se encontram depois de enormes quantidades de informação que se armazenam nas bases de dados. O repórter não poderá, portanto, deixar de “ver” também nesta direcção.
6.2. Saber escutar
Além de saber ver, o repórter deve saber escutar, não só ouvir. Escuta-se com os cinco sentidos, não só com o ouvido: prestando atenção e - sobretudo - querendo entender:
“Quando se escuta de verdade, presta-se atenção. Isto é, suprime qualquer outro objecto de atenção que não seja a pessoa escutada. E não só ouve a sua voz, mas também a vê, a toca, a cheira, a saboreia. E não só quer entender o que o outro lhe diz, mas também quer entender que lhe quer dizer com o que lhe diz (…). Saber escutar é algo mais que prestar toda a atenção, algo mais inclusivamente que tentar entender que me quer dizer, o outro com o que me diz. Escutar é, sobretudo, querer entender por completo, querer entender como o outro se entende a si mesmo. Isto é o que em linguagem comum chamamos “pôr-se no lugar ou na pele do outro”” (Sánchez Sánchez, 2000: 168-169).
No repórter de rádio esse saber escutar é duplo. Por um lado, saber escutar os dados como “portadores de sentido” (Burguet, 2004: 132), que lhe permitam “orientar-se entre as espessuras da actualidade e alcançar todos os dias o claro onde se ilumina a jornada” (Vigil, 1972: 171). E, sobretudo, saber escutar as pessoas como seres humanos concretos, com sentimentos, sensações, ideias e reacções.
Mas, além disso, na rádio, esse saber escutar tem que se traduzir logo num texto que seja contado e escutado. Efectivamente, dada a natureza sonora do meio, o repórter deve fazer um esforço adicional para levar essas imagens visuais aos ouvintes utilizando só o som:
“Escrever para a rádio é escrever para que a sucessão de sons produzidos pelo emissor gere ideias e realidades não só inteligíveis para o ouvinte, mas também capazes de recriar imagens com sentido. No terreno informativo e do ponto de vista redactorial deve-se trabalhar para conseguir que essas imagens que o ouvinte recria sejam o mais precisas e próximas da realidade dos factos e acções que se narram” (Martínez-Costa, 2002: 98).
Desta forma, o bom repórter radiofónico tem que fomentar o hábito de saber escutar, a fim de construir logo textos que contenham uma carga importante de imagens com sentido. Como se pode ver, escutar não é só estar atento a todas as fontes, mas ter a capacidade de contar logo o que se viu, através de sons.
6.3. Saber pensar
Uma vez que o repórter viu bem e escutou com atenção, confronta-se com a tarefa de parar a pensar, o que significa precisamente isso: parar e logo, uma vez parado, pensar: “Só o que pensa bem e com clareza é capaz de expressar algo que valha a pena e de um modo inteligível. E se o que diz é genuíno e valioso, com certeza que acertará a expressá-lo devidamente. (…) A força, o vigor, a garra de uma mensagem escrita, sonora ou audiovisual não dependem tanto da sua forma como da força, o vigor ou a garra do pensamento que expressam” (Sánchez Sánchez, 2000: 170).
Como vemos, neste saber pensar, o rigor e a independência são requisitos chave. Do rigor, diz Sancho (2004: 43) que reforça a credibilidade: “O jornalista não existe para especular nem aventurar, mas para averiguar o que não sabe, para procurar os dados, os argumentos e as opiniões de que necessita para corroborar as suas afirmações”. Por sua vez, segundo o autor, o rigor implica por sua vez outra série de princípios (Sancho, 2004: 43):
a) A objectividade: o jornalista não deve manipular nem tergiversar, mas tratar a informação com seriedade e respeito. Mais além da frase bonita, a missão do profissional não é ajuizar mas oferecer os elementos relevantes para que o juízo da sua audiência seja acertado. A audiência procura dados porque são evidências, não suposições.
b) A profundidade: o repórter averigua até ao último detalhe, oferece todos os dados possíveis e verifica-os. O repórter pergunta e repergunta as vezes que seja preciso porque não afirma nada sem segurança.
c) A precisão: que obriga o repórter a confirmar até o dado mais secundário (um nome, uma referência, uma data...)
d) O escrúpulo: que o leva a um máximo controlo de qualidade da escrita, em todos os seus diferentes aspectos.
Juntamente com o rigor, a independência é também fundamental quando o repórter reflecte sobre o material que seleccionou. Seguindo Sancho (2004: 43), a independência do repórter não se demonstra através de uma posição editorial ideológica concreta mas melhorando o tratamento informativo. Isto significa, entre outros, que (Sancho, 2004: 43):
a) O repórter é mais independente quanto mais amplo o número e a qualidade das suas fontes: afastando-se da excessiva proximidade, confirmando os factos com mais implicados, abrindo o espectro a entidades cidadãs e sociais e - sobretudo - analisando a fundo as suas fontes para discernir quais são fiáveis e quais não são.
b) Um repórter só rectifica quando se equivoca, mas não se retracta das suas informações pelas pressões dos protagonistas ou dos implicados nos factos narrados
c) O repórter nunca acomoda a informação à possível visão interessada e parcial das suas fontes (políticas e económicas) ou dos clientes do meio para que trabalha (anunciantes).
Quer dizer, o repórter deve pensar sobre o material que reuniu nas fases de ideia, propósito, perspectiva e investigação com rigor e independência, não de maneira mecânica ou sem se deter a reflectir sobre as causas, as consequências, as repercussões e, finalmente, sobre o seu verdadeiro significado.
Esse “saber pensar” deve levar o repórter a atribuir um sentido, a explicar o significado do que se passou. Seguindo Burguet, comprovou-se que a objectividade, a que tanto se apelou nos primeiros manuais de redacção jornalística[2], não só é impossível mas também, além disso, é insuficiente. Os dados reclamam ser interpretados, para saltar do seu significado “imediato, insubstancial e deficiente”, para o seu sentido “profundo e contextual”. Desta maneira, continua Burguet (2004: 129), é que, paradoxalmente, a melhor maneira de ser o que tradicionalmente se quis entender por “objectivo” é não o ser e, ao contrário, ser subjectivo: subjectivo e competente:
“E, dessa forma, de acordo com a sua competência contextual e textual e o seu legítimo ponto de vista - inevitável de qualquer maneira - interpretar a actualidade e atribuir-lhe um sentido (…) pelo contrário, a pior maneira de ser “objectivo” será ser “simplesmente objectivo”, informar só o que se costuma chamar informação pura, dados objectivos, cingir-se só aos factos objectivos que são incompletos ou induzem em erro por defeito ou ao engano por omissão e que, em todo o caso, sempre serão insatisfatórios, e inclusivamente fraudulentos” (Burguet, 2004: 129).
Em consequência, o repórter deve ter a capacidade de “fazer falar” os dados, de “decifrar o sentido oculto sob o sentido aparente, desmontar os níveis de significação implícitos sob a significação literal” (Ricoeur, 1969: 16-17), para oferecer um “luminoso quadro de conjunto” (Minguijón, 1908: 195). Por utilizar a expressão de Burguet, é necessário que os repórteres evitem a “miopia contextual” (2004: 133) e interpretem a informação, destapando o sentido da actualidade e tratando também de encontrar uma explicação para o porquê das coisas (Burguet, 2004: 137). Além disso, como resultado do seu labor de investigação num tema concreto, o repórter adquire certa condição de especialista[3] e, como ele, deve ser capaz de “interrelacionar as informações, contextualizá-las e dar-lhes um sentido em relação com a evolução da sociedade e as mudanças do destino humano” (Fontcuberta, 1993: 45).
Hoje, a necessidade de que o repórter reflicta para interpretar e contextualizar a realidade é mais urgente que nunca. Segundo Van Cuilenberg (1987: 105-121), uma das profundas contradições da sociedade moderna consiste precisamente nisto: em que jamais o homem contou com tanta informação - calcula-se que a informação disponível se duplica em cada cinco anos - e, contudo, jamais esteve pior informado; isto é, todos esses dados isolados não chegam para constituir uma resposta cabal às necessidades vitais do homem[4]. O paradoxo explica-se se tivermos em conta que, com frequência, todas essas informações são respostas a perguntas que ninguém formulou e que a ninguém interessam (Sánchez Sánchez, 2000: 172-173). Em consequência, diz Kapuscinski, é que quando “a tecnologia torna possível a construção de uma aldeia global, os meios reflectem o mundo de maneira superficial e fragmentária” (2004: 33)[5]. Em similares termos se expressam Benavides e Quintero para quem os denominados géneros interpretativos adquirem hoje uma importância decisiva:
“Apesar da modernização dos géneros informativos, é pouco provável que uma notícia dê conta do como e o porque de um acontecimento. Em geral, estas perguntas são abordadas pelos géneros interpretativos. Estes se preocupam por proporcionar o contexto e a história necessários para pôr qualquer fenómeno social em perspectiva, de modo que o leitor entenda cabalmente as suas consequências” (Benavides e Quintero, 2004: 176).
Pois bem: dentro do que os autores denominam géneros interpretativos, se situa a reportagem, que, por vezes, demandará também do repórter que tenha certa capacidade de previsão. Neste sentido, a reportagem, como a crónica, está animada por uma vocação informativa que vai mais além de ser mero testemunha do evento que se produz nesse momento e trata de “oferecer alguma curiosidade - leves notas ao fio do acontecer - acerca de possíveis rumos num futuro mais ou menos próximo” (Abril, 2003: 94).
Além disso para a rádio, que tem os seus textos limitados temporalmente, saber pensar é o passo necessário para poder seleccionar e contextualizar os factos de uma maneira adequada. Cumprir com todos os requisitos da reportagem numa peça de 2 ou 3 minutos, por exemplo, só é possível se o repórter reflectiu sobre os factos e/ou acções que se querem narrar para dar com a essência do tema e logo adoptar a forma expressiva breve, clara, coerente e redundante que exige o meio como tal.
6.4. Saber expressar-se
Depois de ver bem, escutar com atenção, analisar as causas e adiantar as possíveis consequências, chega a altura de contar, de que o repórter, como investigador e conhecedor profundo da realidade que estudou transmita aos seus ouvintes a segurança de conhecer bem os factos e o seu cenário. Este, o da expressão, é um passo tipicamente jornalístico que leva a pensar que algo há de certo na afirmação de que “no fundo, tudo é forma”. Dito de outro modo, não ganhamos nada se soubemos ver, escutar e pensar com acerto se, na altura de representar a realidade, fica tudo vertido num texto caótico em que nem sequer é possível distinguir entre os dados, os antecedentes, as causas, as repercussões, os casos similares, as reacções, etc. Também a estes efeitos, a força do estilo de cada autor dependerá do vigor das suas ideias e sobretudo da sua clareza e profundidade (Martín Vivaldi, 1981: 36), o que dá uma nova mostra da importância de que o repórter reflicta sobre o seu material.
No resto, na reportagem, a expressão poderia ter as seguintes cinco características. Deverá ser clara, original, variada, estruturada e com ritmo. Clara, em primeiro lugar, porque também na reportagem como, em geral, em qualquer texto jornalístico, a clareza é a “primeira qualidade da linguagem” (Azorín cit. Em Merayo e Pérez Álvarez, 2001: 101) e “condição primeira da prosa jornalística” (Martín Vivaldi, 1973: 29). Na rádio, o repórter se deve expressar ainda com maior clareza, dado o carácter irreversível do canal e a fugacidade do relato. Em consequência, não se trata sem mais de algo recomendável: trata-se do ser ou não ser da reportagem em rádio. Portanto, o repórter deve ir, como diria Azorín, “directamente às coisas” e cada frase jornalística tem que estar construída de tal forma que não só se entenda bem, mas também não se possa entender de outra maneira. Para isto, a clareza deve ser enunciativa, temática e técnica.
Vejamos que recomendações práticas existem em cada caso, tanto ao escrever como ao pôr em antena uma reportagem (Merayo e Pérez Álvarez, 2001: 102-125)[6]:
a) A clareza enunciativa: que aconselha a frase corta, simples e que tenda à estrutura lógica, o verbo de acção e dinâmico[7], a voz activa, o modo indicativo, o uso do tempo presente e pretérito perfeito, o emprego da redundância e o estilo directo baseado no apelo ao ouvinte. Sugere-se também eliminar a perífrase, o termo vazio de significado e o elemento supérfluo, a muleta estilística, a oração subordinada e o abuso de complementos. Na sua locução, o repórter deverá esforçar-se por vocalizar e articular todos os fonemas de cada sílaba e todas as palavras da frase, adequar a sua voz ao carácter geral do programa, dar sentido ao que lê e ler com ritmo mas não a grande velocidade
b) A clareza temática recomenda que o repórter compreenda primeiro totalmente. Na sua expressão, se aconselha escolher a palavra simples, arredondar números, traduzir gírias e termos científicos, fazer compreensíveis as quantidades, usar tempos psicologicamente próximos do presente e preferir o estilo verbal face ao nominal[8]. O repórter deve evitar o neologismo, o estrangeirismo de última hora, o tecnicismo e a sigla pouco conhecida.
c) A clareza técnica refere-se à transmissão técnica da reportagem mediante um sinal nítido e definido, e que posteriormente se receba sem uma perda considerável da sua qualidade. Isto faz com que a escuta seja mais eficaz já que se realiza com o mínimo esforço de interpretação, a máxima concentração informativa e os melhores padrões de qualidade no som.
Em segundo lugar, a expressão da reportagem em rádio deve ser original. Como dizíamos antes, qualquer reportagem quer ser original, nova, inovadora, única e diferente. De algum modo, qualquer reportagem quer ser recordada porque, antes dela, nunca se escutou algo assim (Cebrián Herreros, 1992: 149). Na prática, esta originalidade alarga-se desde o fundo até - sobretudo - à forma adoptada.
Referimo-nos neste ponto à originalidade quanto à forma que virá, sobretudo, pelo tipo de narrador que se use, o uso da linguagem radiofónica e pelos tratamentos de espaço e tempo. Neste último ponto, o repórter poderá fazer uso de analepse ou prolepse, começos in media res, estruturas circulares, elipses, resumos, cenas, pausas, digressões, relatos singulares, anafóricos, repetitivos, iterativos, etc. (Herrera, 2007c).
Além de clara e original, a expressão na reportagem radiofónica deve ser variada. Dito doutro modo: na altura de elaborar as suas reportagens, o repórter deve ter “mentalidade radiofónica”, posto que o mesmo texto permite “um máximo rendimento e eficácia expressiva do audiovisual para comunicar o que o repórter quer” (Cebrián Herreros, 1992: 153). Isto é assim porque, efectivamente, a principal diferença entre a reportagem e outros géneros dedicados à informação é a maior variedade e intensificação de recursos que se permite. Isto dá à reportagem um colorido mais vistoso e assemelha-a esteticamente a outros como o documental ou o dramático (Martín Vivaldi, 1987: 73 e ss.)[9]. No resto, esta variedade tem muitas facetas que incluem a variedade no uso de fontes, no emprego de testemunhos (Soengas, 2003: 59-60), no uso de géneros, no emprego dos elementos da linguagem, na utilização de transições e também nos tratamentos de tempo e espaço.
De todas estas, talvez convém deter-se na variedade no uso dos elementos da linguagem já que é uma das facetas em que se observa uma maior diferença quanto ao que acontece em prensa. Na reportagem em rádio, embora a palavra continua a ser o elemento predominante e o que ocupa o primeiro plano, a música, o silencio ou os efeitos desempenham também um papel importante. Sobre eles recai quase sempre a condição descritiva (Martínez-Costa, 1999: 104) e podem levar a cabo funções ambientais, localizadas, expressivas, narrativas, ornamentais, etc. (Merayo e Pérez Álvarez, 2001: 36-58 e Gutiérrez e Masna, 2002: 33-68). O repórter procurará então a maior quantidade e qualidade de sons possíveis, mostrando também uma predilecção especial pelos sons diegéticos, os captados da realidade (Cebrián Herreros, 1992: 179).
Em quarto lugar, o repórter procurará que a sua expressão seja estruturada, isto é, que esteja disposta de modo coerente, ordenado e de acordo a um fio argumental. Esta é a função de qualquer boa estrutura: ajudar a que o texto se compreenda melhor e a que resulte mais atractivo (Martínez-Costa e Díez Unzueta, 2005: 119). Embora a estrutura geral de qualquer reportagem costuma incluir uma abertura, um desenvolvimento e um fecho, na prática, cada um destes elementos, pode ser de muito diverso tipo (Ulibarri, 1994 e Herrera, 2007b).
Finalmente, é muito importante que, nesse saber expressar-se, o repórter imprima ritmo aos seus textos. No entender de Martínez-Costa e Díez Unzueta (2005: 81), “o ritmo é a maneira peculiar de combinar os diferentes elementos da linguagem radiofónica no tempo e no espaço, de maneira que estabeleçam uma estrutura ordenada e harmónica que outorgue um sentido à mensagem e desperte o interesse de quem escuta”. Ao contrário da notícia ou da crónica - muito mais funcionais -, na reportagem possibilita-se uma “elaboração expressiva e rítmica mais variada que outros géneros de monólogo. Não só no que respeita à palavra, mas também porque permite a inclusão e combinação de música, efeitos e sons” (Martínez-Costa e Díez Unzueta, 2005, pp. 124-125). Na prática, para conseguir o ritmo que deve caracterizar toda a boa reportagem, o repórter dispõe de duas ferramentas: o contraste e a montagem (Herrera, 2007c) mas, em qualquer caso, o mais importante é que este ritmo torne mais clara e atractiva a escuta do texto, sobretudo naquelas reportagens de uma maior duração, como podem ser as reportagens de investigação (Herrera, 2008).
Estes seriam portanto os cinco requisitos que deve reunir a expressão da reportagem. A partir daí, e dado que na reportagem se valora a dimensão estética do texto, se aprecia também o estilo do repórter como um “modo concreto de plasmar, utilizando os recursos de uma língua historicamente determinada, umas ideias, acções ou comentários” (Martínez Vallvey, 1996: 29)[10]. Neste sentido, e de maneira muito condicionada ao tipo de reportagem que se elabore, podiam-se somar aqui todos os requisitos do bom estilo jornalístico que tem a ver com a concisão e a estrutura que capte a atenção (Dovifat, 1959: 125-127), assim como com a densidade, exactidão, precisão, simplicidade, naturalidade, variedade, atracção, ritmo, cor, sonoridade, detalhismo (Martín Vivaldi, 1993: 29-34). A estes podiam-se juntar também a ordenação lógica, a surpresa, o humor, a ironia, o paradoxo, o ritmo, a metáfora, o som, o ambiente, a ordem e o remate (Grijelmo, 1997: 304-341).
Pelo contrário, o repórter procurará fugir de tudo o que tem a ver com o mau estilo jornalístico que se caracteriza por “a obscuridade de pensamento e de expressão, a verborreia pouco significante, a inexactidão e a vacuidade na expressão, a imprecisão na estrutura da fase, o artificioso e rebuscado, na selecção da palavra e construção da frase, a afectação, a vulgaridade, a desnecessária amplitude, a monotonia, a pobreza expressiva, o tom gris ou incolor, a arritmia, a cacofonia e a incorrecção gramatical (Martín Vivaldi, 1973: 37-38). Numa perspectiva mais concreta, o repórter deverá fugir também da pobreza de expressão, da vulgaridade, do abuso de verbos como realizar, haver, ser e estar, os tópicos, os sons disléxicos, os estiramentos, as perífrases, a linguagem de oficina, as contínuas frases intercaladas, o verbo no final, a abundância de advérbios em mente, as cacofonias, o abuso de siglas ou o abuso do guião (Grijelmo, 1997: 341-406). Insistimos uma vez mais: tudo deve estar subordinado à função comunicativa da reportagem, sem esquecer que a clareza é a condição primeira de qualquer reportagem em rádio.
Quanto à sua narrativa, poderia servir a imagem do repórter como bom orador, que é aquele que, além de conhecer bem a matéria, preparou a consciência, sabe-se expressar, convencer e mostra-se seguro (Studer, 1999: 21). Neste sentido, ao repórter pedem-se todas as qualidades que se exigem de um bom orador[11]. Não obstante, vamo-nos deter em duas qualidades específicas do bom orador, e também do bom repórter: a improvisação e a voz.
Efectivamente, - muito mais que em outros géneros -, o repórter, sobretudo o que elabora reportagens de rua e em directo, deverá ser capaz de contar as coisas enquanto se estão a produzir e de improvisar, para saber expressar “sem mais preparação que o conhecimento que se tenha, qualquer coisa com sentido” (Saiz, 2005: 65)[12]. O domínio desta capacidade permite-lhe enfrentar o “medo cénico”[13] que costuma acompanhar as suas primeiras intervenções e evitará também a “parcialidade, o exagero, a prolixidade e a divagação” do que improvisa sem conhecimento[14].
Posto que trabalha em rádio, é preciso também que a sua voz seja clara e agradável, com personalidade e capaz de captar a atenção do ouvinte do princípio até o final (González Conde, 2001: 169). Neste sentido, mudaram as qualidades que actualmente a voz de um repórter radiofónico deve ter:
“Na actualidade se procura mais a voz viva, intensa, comunicativa, que a voz perfeitamente emitida, mas distanciada e grandiloquente. A voz do locutor profissional esteve excessivamente submetida a cânones perfeccionistas em busca de um estilo de dicção, impoluta, mas procurou ao mesmo tempo um distanciamento, uma frialdade comunicativa. As novas maneiras radiofónicas dão prioridade ao estilo directo e informal, e ao mesmo tempo carregado de força expressiva pela vivência que se põe no que se diz” (Cebrián Herreros, 1983: 59).
Além disso é importante que o repórter tenha um conhecimento do meio: da sua linguagem, da sua técnica e de questões específicas do estilo da emissora que, em alguns casos, ficarão expressadas nos livros de Estilo[15] e em outras terão antes o carácter de leis não escritas. Deverá conhecer as peculiaridades da realização técnica, adoptar uma atitude de respeito perante o microfone, seleccionar sons inteligíveis com valor informativo, prescindir daqueles que não tenham qualidade técnica nem informativa e reagir com naturalidade e prontidão perante os erros técnicos (Martínez-Costa, 2002: 102).
E finalmente, também é importante que o repórter recorde que, pese a importância da sua expressão, ele não é o protagonista do texto. Dito doutra forma: embora o repórter imprima um olhar pessoal ao texto - na estrutura, nos verbos, nos advérbios, na linguagem, nos testemunhos que escolha, etc. - Deve cingir-se sempre aos factos e aos seus personagens. Assim o afirma Cebrián Herreros:
“O repórter tem que estar disposto a realizar o seu trabalho em condições precárias, submetido a pressões de que tem que se libertar. Não importam as vicissitudes por que passe: perseguições, prisões ou detenções e homenagens. O importante é o resultado final, as imagens e os sons alcançados. E, além do mais, isto é o único que sai para o ar. O que interessa à audiência é a vida do que mostra, não a do repórter” (Cebrián Herreros, 1992: 158).
Em consequência, o repórter deverá ter consciência sempre de que a sua presença importa na medida em que aprofunda, investiga e expõe de modo variado uns factos, fazendo de intermediário entre esses factos e a audiência. Mas ainda assim, tudo isto não é suficiente para se transformar num bom criador de reportagens em rádio: ainda falta uma qualidade mais.
6.5. Aprender que é o homem
Se antes dizíamos que, no possível, as reportagens teriam que se orientar para dar as verdadeiras respostas às verdadeiras perguntas, continuamos a avançar com Sánchez Sánchez e vemos que a expressão, com toda a importância que tem, por si só não basta. Não basta dominar as linguagens. De novo é preciso dar um passo mais: conhecer a fundo o ser humano, posto que este é o objecto e o fim das suas mensagens:
“Nada interessa tanto ao homem como o próprio homem (…) Só é capaz de entender o genuinamente humano - e portanto de o fazer entender - quem se aproxima sempre das pessoas, não já com respeito, mas inclusivamente com carinho; quem procura tratar sempre os outros, a cada homem e a cada mulher, como fins em si mesmos e não como meios para alcançar outros fins que sempre serão egoístas. O que procede assim - o que trata os outros como meio para os seus próprios fins - é um manipulador, por muito dignos ou elevados que sejam os seus próprios fins. E um manipulador é a antítese de um bom comunicador” (Sánchez Sánchez, 2000: 174)[16].
Isto, que poderia ser válido para qualquer jornalista em geral, é ainda mais útil para o repórter radiofónico, sobretudo porque a natureza do seu ofício se baseia precisamente em falar com uns e outros, e em compreender uns e outros. Neste sentido, Kapuscinski afirma que nenhuma sociedade moderna poderia existir sem jornalistas, mas os jornalistas por si só não existiriam sem a sociedade:
“Um jornalista não se pode colocar acima daqueles com quem vai trabalhar: ao contrário, deve ser um parceiro, um mais, alguém como esses outros, para se poder aproximar, compreender e logo expressar as suas expectativas e esperanças (…) Convém ter presente que trabalhamos com a matéria mais delicada deste mundo: a pessoa” (Kapuscinski, 2004: 16-17)[17].
Este aproximar-se do ser humano tem várias consequências, muitas delas éticas. Desta forma, o bom criador de reportagens em rádio procurará (Sancho, 2004: 49-50):
1) Saber ver, escutar e dialogar com a pessoa, para ver a melhor forma de a servir
2) Não se limitar ao aspecto superficial das coisas
3) Não “coisificar” a existência humana, reduzindo-a ao material ou biológico
4) Não reduzir a enorme riqueza da actividade humana aos seus aspectos meramente políticos. Nem dar primazia à política sobre o saber nem à técnica sobre a ética
5) Fugir da tendência para sublinhar ou ficar só pelos aspectos subjectivos ou sensacionalistas, sem ter em conta os direitos individuais de cada pessoa
6) Expressar os valores humanos dignos de ser difundidos na medida em que contribuem para a construção da comunidade e a promoção do homem
7) Desenvolver um labor positivo de sensibilização cultural e moral dos públicos, enquanto pessoas e cidadãos, num diálogo reflexivo e aberto, estimulando tudo aquilo que favoreça o seu crescimento plenamente humano, de acordo com a sua dignidade
8) Chamar mau ao mau, terrível ao terrível, injusto ao injusto... E bom ao bom, heróico ao heróico, justo ao justo, adequando o tratamento à realidade e ao fim humano, sem trivializar nem tratar com banalidade nem um nem outro
9) Conhecer os efeitos das acções informativas na perspectiva da dignidade da pessoa como dados inatacáveis de autocorrecção (do negativo) e estímulo de melhoria (do positivo).
Numa perspectiva mais concreta, convém recordar também que “as reportagens sobre grandes temas adquirirão maior interesse do princípio se tiver um arranque humano concreto” (Grijelmo, 1997: 63). Além disso é muito recomendável que a reportagem intercale os números e dados com o denominado interesse humano. Em palavras de Grijelmo: “Os números são frios. Os personagens cálidos. Portanto, com a adequada mistura entre uns e outros podemos temperar o nosso texto” (1997: 64). É possível que este interesse humano resulte irrelevante em termos estritamente informativos mas acerca ao ouvinte ao evento e aos seus protagonistas. Uma vez mais, a objectividade é insuficiente também para estes fins:
“Sinto que esta teoria chamada da objectividade é totalmente falsa e produz textos frios, mortos, que não convencem a ninguém. Eu sou partidário de escrever com paixão. Quanta mais emoção, melhor para o leitor. Não tenho dúvidas sobre isto: os melhores textos jornalísticos foram escritos com paixão, transmitem que se está verdadeiramente vinculado e metido no assunto do qual escreve. A emoção dá força ao texto” (Kapuscinski, 2004: 88).
É óbvio que o repórter não deverá empregar esta presumida emoção como coarctada para justificar um ar sensacionalista mais ou menos fácil. Nos seus relatos, procurará antes retratar a essência da natureza humana e a sua dignidade que, ao fim e ao cabo, é o que todos temos em comum e o que transforma algumas reportagens em textos universais.
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Van Cuilenberg, J. 1987. “The Information Society: Some Trends and Implications”. European Journal of Communication, 2: 105-121.
Vigil, M. 1972. “El Ofi cio de Periodista. Noticia, Información, Crónica. Barcelona: Dopesa.

[1] Algumas das clássicas são as de Schowebel, Francos Rodríguez, ou Elliot recolhidas e estudadas por Iglesias (1984: 149-195). Neste ponto pode-se incluir também a de Brajnovic (1978: 258 e ss) que completa o panorama numa perspectiva deontológica. Sobre o jornalista radiofónico, pode-se ver Arias, 1964: 405-406, Merayo, 2000: 56-65 ou Saiz, 2005: 15-20.
[2] Nos últimos anos, a objectividade ha sido muito criticada e inclusivamente desterrada. Trata-se, se disse, de um mito, de uma ilusão ou directamente de um engaño, que sempre se encontrará com o limite insalvável de que o jornalista é um sujeito e não um objecto e, portanto, a objectividade plena é impossível. Existe ademais um grande consenso entre os autores em que todo acto jornalístico é um acto interpretativo e, por conseguinte, subjectivo (Abril, 2003: 22). Partilham este parecer a maior parte dos estudososde a redacção jornalística em Espanha: Gomis, Núñez Ladeveze, Casasús, Aguinaga, Borrat, Fagoaga, Verón, Morin, etc. Em consequência, pretender a objectividade em jornalismo é um erro de concepto. Simplesmente não é possível.
[3] A necessidade de interrelacionar a informação não é o único aspecto que partilham as figuras do jornalista especializado e o repórter. Bergança (2005: 75) propõe outras formas de proceder para o jornalista especializado que bem podem asimilar-se para o caso do repórter: “la desconfiança da informação que se vierte em ruedas de prensa e através de portavoces oficiais; a formação baseada na experiência profissional; a paixão por um jornalismo vital, de acção, que procura relatar os acontecimentos dos que é testigo, desconfiando dos dados que lhe transmitem as fontes institucionais e interessadas; a preferência por determinados géneros jornalísticos (…); a perspectiva humano, directo, pessoal e original das informações; a exactitude e o rigor; o não ficar-se com a descripção fragmentada do pressente, adelantando-se na previsão dos acontecimentos futuros (…)”.
[4] Kapuscinski partilha esta impressão quando afirma: “Corremos o peligro de chegar a uma situação na qual os dados abundem mas nuestra imaginação não saiba como processá-los e utilizá-los em nuestra vida prática. Esta contradicção sintetiza o drama de nuestra cultura: acumulamos mais e mais dados, mais e mais rapidamente, mas fazerlo não nos ajuda a entender nem melhorar o mundo” (2004: 89).
[5] E, em outro momento, Kapuscinski acrescenta: “O bom e o mal jornalismo se diferênciam fácilmente: no bom jornalismo, ademais da descripção de um acontecimento, tenéis também a explicação de por que ha sucedido; no mal jornalismo, por outro lado, encontramos só a descripção, sem nenhuma conexão ou referência ao contexto histórico. Encontramos o relato do mero facto, mas não conhecemos nem as causas nem os precedentes” (2002: 58).
[6] Este apartado pode-se completar com algumas das recomendações que oferece Martínez- Costa (2002: 97-119) para escrever notícias para rádio.
[7] “É sempre o verbo o que presta alas à marcha da linguagem. Embora esta é uma verdade básica, de aprendiz, hoje se lhes esqueceu inclusivamente a pessoas muito doctas. A mania de substantivizar paraliza a vida de qualquer linguagem. Parece como si um temer que se lhe perder algo no fluir das coisas e do idioma, e por isso o fixa angustiosa e espasmódicamente no substantivo. Na informação, o emprego desta condensação lingüística do medo é duplamente desacertado, pois os substantivos, em especial os acabados em -ção e -dade, se atraviesam como troncos no caminho, enquanto os verbos, especialmente na forma activa, operam, movem e empujam para delante” (Dovifat, 1959: 126).
[8] Segundo Núñez Ladeveze isto provoca certa inexpressividade, um distanciamento do sujeito narrador, de ocultamento da personalidade de quem enuncia. Frente a isto , “o dinamismo do relato depende da acção verbal enquanto o carácter objectual e abstracto dos nomes provoca uma impressão mais estática e menos pessoal” (1991: 118).
[9] Em parecidos termos se expressa Chilhón para quem a característica mais importante do género é a diversidade funcional, temática, compositiva e estilística e “o único limite é o imposto pelas exigências de clareza, exactitude e eficacia inherentes a todo jornalismo informativo de qualidade” (1994: 19)”.
[10] Quanto ao estilo em geral, Rodríguez Jiménez (1991: 113-116) destaca que as características de qualquer estilo devem ser seis: sinceridade, clareza, precisão, simplicidade, concisão e originalidade.
[11] Isto verifica-se em requisitos mais concretos como “Fala de campos que conhece, domina a matéria, conhece o seu público ou, no seu caso, é capaz de fazer rapidamente uma ideia sobre ele, estruturou o seu discurso de forma óptima, dispõe de um amplo vocabulário, mostra-se estilisticamente seguro, recorre a refrães e ditos no momento adequado e cita de forma correcta, mostra-se interessado pela matéria que trata e desperta interesse no auditório, ao qual sabe motivar e atrair para a sua causa” (Studer, 1999: 21).
[12] A este respeito, costuma ser útil preparar um esquema, mental ou escrito, com aquelas três ou quatro ideias chave que o ajudarão a sair com êxito da sua narração ou exposição improvisada. Assim, na altura de improvisar, o repórter poderia seguir estas directivas (Saiz, 2005: 66-67):
i) enfrentar a improvisação numa boa base de conhecimento e preparação, ou seja, com essa boa bagagem de saber e experiência que se supõe que o profissional tenha,
ii) Tomar cosciência de que se vai improvisar, sabendo que se vai saber fazer bem e superar o problema,
iii) Evitar o excesso de segurança ou confiança que pode ser mau,
iv) Ter certo medo superável ou certa tensão emocional, positiva, que não afecte mas que alerte, já que isto pode facilitar uma reacção rápida a esse imprevisto que se produz num momento e que leva a pôr em marcha o mecanismo da improvisação,
v) Utilizar uma voz bem colocada e segura que não mostre vacilações nem se julgue dubitativa e
vi) Acrescenta uma enorme capacidade de imaginação que lhe permitirá dizer, da melhor maneira possível e do modo mais compreensível para o ouvinte, as melhores ideias ou uma correcta e interessante narração de uns factos.
[13] Denomina-se medo ou pânico cénico ao temor de falar ou aparecer em público. É possível que se trate de um dos maiores medos do homem, pois altera o pulso e o metabolismo em geral, o qual se pode manifestar através de sintomas chamativos como palpitações, corar, suores frios, garganta seca, tensões musculares ou voz tremida. Para um repórter, tal como para um orador, a pior das manifestações destes medos é a de ficar mentalmente em branco, o que em inglês se chama blackout (Studer, 1999: 91)
[14] Para o superar, a boa improvisação baseia-se no empenho que se ponha nos ensaios, na escuta atenta doutros profissionais e numa boa documentação (Blanco, 2002: 102). Assim, Balsebre (1994: 37) recomenda não falar do que não se conhece, não sair do tema e aprender a expressar-se com naturalidade e educação, mostrando uma atitude relaxada, de cumplicidade com a audiência. Juntamente com estes, o repórter deve evitar continuar a falar, construir discursos que possam incluir mentiras ou coisas incertas - só pelo medo de ficar em branco - ou ligar demasiadas ideias com um facto de forma que se afaste do objectivo principal da narração.
[15] Partilhamos com Cebrián Herreros a ideia de que estes não devem ser vistos como uma mordaça à liberdade de expressão, mas antes como a “plasmação da identidade corporativa, que marca a identidade jurídica e programática de uma emissora” (1994: 377).
[16] No mesmo sentido, afirma Kapuscinski (2002: 38), “as más pessoas não podem ser bons jornalistas. Si se é uma boa pessoa pode-se tentar compreender os outros, as suas intenções, a sua fé, os seus interesses, as suas dificuldades, as suas tragédias. E transformarse, imediatamente, no primeiro momento, em parte do seu destino (…) Mediante a empatia, pode-se compreender o carácter próprio do interlocutor e partilhar de forma natural e sincera o destino e os problemas dos outros”.
[17] A necessidade de que o repórter sinta respeito pelas pessoas apresenta-se de um modo particular na crónica de tribunais pelo que este nunca deverá esquecer que detrás dos acusados há famílias prejudicadas e sensíveis: “o jornalista deve medir com sumo cuidado que palavras utiliza e sobretudo a sua qualidade humana, sendo sempre sensível e respeitador nas suas informações” (Seijas, 2004: 347).

Reflexões vertidas para aulas por

Rui de Melo

Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de Salamanca e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto

Professor Associado, aposentado, da Universidade Fernando Pessoa 

Com base em artigo da professora Susana Herrera Damas, publicado na Revista RE - presentaciones Periodismo, Comunicación y Sociedad. sherrera@udep.edu.pe

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