Adriano Correia de Oliveira, meu colega dos desafinados da turma B
Rui de Melo
Tributo a Adriano Correia de Oliveira apareceu no grupo de
amigos de Arnaldo Trindade, no Facebook.
Fomos colegas na turma B do 1º ano, no Liceu Alexandre
Herculano. Adriano era um rapaz alto, afável, bom colega e bom aluno. Enquanto
ele era o maior da turma eu era um dos mais pequenos. Fazia questão de me
proteger dos cachaços que os mais pequenos levavam dos mais crescidos. Quando
chegou a altura de fazer a classificação das vozes, lembro-me que havia três
categorias: a primeira voz, a segunda voz e os desafinados. O Adriano e eu
fomos classificados como desafinados…
O Adriano entrou na Faculdade antes de mim. Quando nos
reencontrámos, na Estação Nova, em Coimbra, rejubilámos e recordámos o episódio
dos “desafinados”. Adriano era, então, a par de José Afonso, uma figura
reconhecida no meio universitário como uma das importantes vozes de intervenção
contra a situação política que se vivia.
A minha atividade na rádio permitia-me divulgar tudo o que o Adriano produzia. Foi sempre um dos "obrigatórios" nos meus programas
O espírito sereno que lhe conheci nos tempos do liceu tinha
dado lugar a um espírito agitado. Coimbra mudara o rapaz de Avintes que andara
comigo nos estudos liceais. No entanto, continuava generoso, tendencionalmente
protetor dos mais fracos como sempre o mostrou no seu intervencionismo.
A vida profissional fez-me abandonar a Faculdade. A vida militar separou-nos ainda mais. Os encontros esporádicos em Coimbra deixaram de acontecer.
Nunca me disse que tinha aderido ao Partido Comunista.
Também nunca lhe perguntei nada sobre particulares opções políticas porque o
importante é que éramos do “contra”.
Só quem viveu aqueles tempos pode dar o verdadeiro valor do que foi o ato heroico de cantar Manuel Alegre, em O Canto e as Armas.
Adriano Correia de Oliveira está entre os fundadores da
Cooperativa Cantarabril (com quem, mais tarde, romperia). A atividade
despoletada pelo 25 de Abril fez-nos só reencontrar em entrevistas ocasionais
de espetáculos ou lançamento de discos. Depois, perdemo-nos de vista. Quando
soube da sua morte e trágicas circunstâncias, em 1982, lamentei o nunca poder
ter retribuído o protecionismo juvenil que dele recebi. Em compensação, ajudei
a fazer de cada disco dele um êxito.
Alguma justiça lhe fizeram os poderes públicos. Em 24 de
Setembro de 1983 foi feito Comendador da Ordem da Liberdade e a 24 de abril de
1994 foi feito Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, ambas as
condecorações a título póstumo.
Os amigos mais íntimos foram criando formas de o manter vivo na nossa memória e na nossa gratidão por quem deu tudo pela liberdade e pela justiça social num cantar único de sensibilidade atuante. Assim se criou o Centro Artístico e Cultural Adriano Correia de Oliveira e escolas e ruas têm o seu nome.
Rui de Melo
Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de Salamanca
e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto
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