Quando Bill Gates e outros se
enganaram
Rui de Melo
Professor Associado, aposentado, da UFP
Resumo
Existem vários processos
de digitalização de emissões de rádio, porém, os fundamentos técnicos do DAB,
com os seus processos, as interfaces, a padronização, os serviços
complementares e o sistema por satélite revelam o Digital Audio Broadcasting
como aquele que apresenta mais vantagens e menos inconvenientes para os
ouvintes. No entanto, a generalização da radionet leva a que comecem a
aparecer pontos de vista a defenderem que está aqui o futuro da rádio. As últimas reuniões científicas que ocorreram na
Península Ibérica foram reflexo destas preocupações em comunicações
interessantes de figuras conceituadas do pensamento do meio rádio. Pretende-se
perspectivar o que, sobre estas questões, esteve em debate nas Jornadas de
Navarra, de Madrid e do Foro Digital. Com o aviso de que não se trata de uma
análise profunda, mas apenas de umas quantas reflexões.
Quando Bill Gates e outros se
enganaram
Contam que Natham Rotschild contratou um barco a
vapor para presenciar a batalha de Waterloo. Terminada a refrega, foi o
primeiro a chegar a Londres com a informação, que não deu a conhecer a ninguém.
Mas fez um gesto aterrador: rematar rápida e publicamente as suas ações. Isto
fez crer aos bolseiros — que sabiam de onde vinha Natham — que Napoleão tinha
ganho. Entretanto, por portas travessas, os seus corretores compravam e
compravam barato para ele no meio do pânico financeiro. No dia seguinte, quando
chegou a verdadeira notícia, subiram as ações muito acima da cotização anterior
à batalha. Então muitíssimas eram já de Nathan, incluindo as que vendeu e foram
recompradas pelos seus agentes. Foi assim como se fundou o ramo Rotschild de
Inglaterra: usando astuta e avessamente uma tecnologia novíssima — o barco a
vapor — que lhe deu uma vantagem estratégica sobre os financistas rotineiros.
Não sei se este episódio é verificável, mas é significativo que se conte, pois,
se na época, a inovação tecnológica, ainda escassa, era estratégica, como será
hoje, quando se moderniza a cada minuto?
Os portugueses ainda hoje têm bem presente o aval de
um presidente da república à emissão de ações do BESCL. Na verdade, a subtileza
da mensagem não dizia às pessoas para comprarem, mas se o presidente
manifestava confiança, porque não comprar? Só que daqui não veio nenhum
Rostchild mas vieram muitas vítimas distraídas pela ambiguidade da informação.
Por outro lado, está confirmado o episódio em que
Napoleão recusou o invento da máquina a vapor. Também é verdade que a máquina a
vapor foi inventada antes de Fulton, em 1543 por Blasco de Garay. Fez a sua
primeira demonstração em Barcelona, mas o ministério da Fazenda, «seja por
superstição ou outro motivo», conta Andrés Belo, não quis dar os fundos para o
desenvolvimento desta tecnologia. Tanto Napoleão como Espanha pagaram caro esta
imprevisão. É fácil imaginar como teria mudado a história se um qualquer deles
tivesse adotado a máquina de vapor.
É o preço da arrogância desdenhosa de certas
tecnologias. Mais próxima no tempo temos o caso do Presidente da Hewlet Packard
perante Steve Jobs e Steve Wozniak, que pronunciou a famosa frase: «Quem quer
um computador pessoal?» A administração da Xerox desdenhou igualmente o computador
de interface gráfica que o seu laboratório de Palo Alto desenvolveu. Apple
Computer adoptou essa tecnologia e criou a Macintosh, a partir da qual se
expandiu a interface gráfica e tornou viável a World Wide Web.
Eis como a informação vale, sobretudo, pelo uso que o
recetor dela faz. Quer o emissor manipule ou não os dados. Aconteça hoje ou há
cem anos. Vamos sempre assistir a desencontros de análises, a verdades
alternativas a não-factos. O recetor não se pode deixar enganar, exigindo a si
mesmo o rigor que as fontes não lhe dão.
A rádio em DAB, por razões que têm a ver com a
popularidade e penetração do meio, pode ser determinante na democratização dos
meios digitais e informáticos criando condições para uma mais eficaz troca de
informações e consequente comunicação. A digitalização em geral e a presença da rádio on line são aspectos evolutivos de uma
situação e de um caminho que já vem de longe e que apenas exige um aperfeiçoamento
processual.
Tenho defendido, e não vejo ainda razões para mudar de
ideias que, não obstante existirem vários processos de digitalização de
emissões de rádio, os fundamentos técnicos do DAB, com os seus processos, as
interfaces, a padronização, os serviços complementares e o sistema por satélite
revelam o Digital Audio Broadcasting como aquele que apresenta mais vantagens e
menos inconvenientes para os ouvintes.
Philip
Laven, Director Técnico da EBU/UER, ao expor a sua comunicação nas Jornadas de
Nuevas Tecnologías[1], em
Madrid, citou umas quantas evidências sobre projecções equivocadas do futuro
por parte de personalidades de grande evidência. Assim, em 1885, Lord Kevin,
reputado matemático e físico, afirmou com toda a convicção que era impossível
que máquinas mais pesadas que o ar pudessem voar.
Bill Gates, em 1981, disse que com 640 Kb de memória os
computadores satisfariam todas as necessidades, e sabe-se quantos “gigas” de
memória já têm até as unidades portáteis. Depois, o mesmo Bill Gates
disse que a Internet era uma questão de uma moda passageira que não tinha
relação nem era pertinente para o seu negocio básico. Também
os técnicos do projecto Eureka 147 DAB eram peremptórios, ainda nos anos 90,
quanto à impossibilidade de digitalização das emissões em AM e FM. Entretanto,
a DRM (Digital Radio Mondiale)[1]
viu a própria International Telecommunications Union (ITU) aprovar o seu
sistema digital de emissão on-air
para frequências abaixo dos 30 MHz (ondas longas, ondas mádias e ondas
curtas) no passado dia 4 de Abril.
Perante
prognósticos destes, é natural que sempre tenha usado de prudência quanto ao
tempo de formação da massa crítica para a aceitação generalizada da rádio
digital, muito especialmente na sua versão DAB.
Não há dúvidas de que a rádio digital vai ser um facto generalizável; o
que falta saber é quanto tempo vão levar os consumidores a disponibilizarem-se,
financeira e psicologicamente, para acederem às novas propostas de
radiodifusão. Situação que nos remete para Markus pela relação que estabeleceu
(em 1987) entre a massa crítica e as tecnologias de comunicação interactiva.
Williams, F., Strover S., Grant, A. E.[2]
citam-na no seu trabalho “Aspectos
Sociais das tecnologias dos novos media”. Como se sabe, dentro de uma
comunidade, a adopção de uma determinada tecnologia, como o telefone ou o
correio electrónico, é uma proposta absoluta. Se se chega a uma massa crítica,
todos os indivíduos de uma comunidade adoptarão eventualmente a tecnologia em
questão, mas se a massa crítica não se chega a formar, o consumo baixará devido
à falta de reciprocidade e, eventualmente, ninguém utilizará a tecnologia.
Segundo Markus, citado por aqueles autores, quanto menos recursos (isto é,
tempo, dinheiro e habilidade) são requeridos ao indivíduo para que se integre
no uso de uma determinada tecnologia, maior é a probabilidade de conseguir a
massa crítica que conduz a um acesso universal. No debate de distribuição de
recursos através de uma comunidade, aquela autora indicou também que uma maior
heterogeneidade de recursos dentro de uma comunidade, além de uma rápida
adopção feita pelos indivíduos com altos rendimentos, aumentará a probabilidade
de formar uma massa crítica[3].
É evidente que, por agora, o DAB e a rádio digital em geral ainda estão a dar
os primeiros passos para possibilitar a formação da massa crítica de que fala Markus...
Os
especialistas estudam a rádio digital
Já por
diversas vezes referi a inevitabilidade do futuro ser digital, mas nunca me
atrevi a “passar a certidão de óbito” ao analógico. Agora o que importa saber é
como está a progredir o processo de formação de massa crítica para o lançamento
definitivo da rádio digital e como disso se faz eco o meio científico.
Reuniões
científicas que ocorreram na Península Ibérica revelaram posições interessantes
de figuras conceituadas do pensamento do meio rádio. Vale a pena confrontar as
posições que as Jornadas de Navarra, de Madrid e o Foro Digital puseram em
evidência. Não é do âmbito deste artigo fazer uma análise tão profunda, embora
seja possível deixar umas quantas reflexões.
Estávamos
no início dos anos 2000. Faus Belau, nas XV Jornadas Internacionais de
Comunicação da Universidade de Navarra[4],
sob o título Reinventar a rádio, citava John Birt, ex director geral da
BBC, na sua consideração do que é a era digital: “caracteriza-se por uma
radiodifusão que precisa de pôr em antena
uma infinidade de serviços que
devem estar à disposição dos ouvintes em
qualquer momento”.
Portanto,
o digital não vai alterar a característica fundamental do meio rádio que
assenta numa comunicação unidireccional. O que se está a passar é um
alargamento de serviços radiofónicos. Mas a emissão analógica já tinha começado
a permitir esse alargamento de serviços quando começou, nos finais dos anos 80
a incrementar o RDS, hoje universalizado, ou seja, com massa crítica
perfeitamente consolidada.
O
paralelismo com o FM
Faus
remete para o que aconteceu em relação ao lançamento do FM em Espanha cujo
período de implantação se prolongou por quase trinta anos. Aliás, Portugal teve
um desenvolvimento mais interessante do FM graças à iniciativa desencadeada
pelo Rádio Clube Português em 1963, ao lançar uma programação autónoma em FM
(em Espanha, tal só aconteceu nos anos oitenta com a Onda Cero). Mesmo assim,
também só nos anos oitenta é que o FM se generalizou e ultrapassou a Onda
Média.
Recordando
tempos idos, é interessante passar uma vista de olhos pelo que ouvia em
Portugal no fim dos anos 60 quando ainda imperava a Onda Média e o FM era uma inovação
só com o entusiasmo do Rádio Clube Português pois as outras empresas não
ousavam criar emissões autónomas, limitando-se a repetir o transmitia a Onda
Média.
[1] DRM
(Digital Radio Mondiale): http://www.drm.org/system/globsample.htm
[2]
Williams, F., Strover S., Grant, A. E., 1994: 624.
[3] Massa
crítica é um conceito dos físicos adoptado pelos cientistas sociais para se
referirem ao número de indivíduos que precisam de ser envoltos num movimento
social antes que se efectue uma “explosão” que faça com que este movimento
social se materialize, conforme Olivier, Marwell e Teixeira, 1985:522 a 556.
[4] XV Jornadas Internacionales de a Comunicación, Reinventar a Rádio, Universidade de Navarra: http://www.unav.es/fcom/jornadas2000/Ponencias/ponfaus.htm
CLASSE SOCIAL
|
Totais |
Alta |
Média Alta |
Média Baixa |
Baixa |
Parodiantes de Lisboa |
27.6 |
9.4 |
14.5 |
27.9 |
31.4 |
Teatro radiofónico |
22.4 |
9.7 |
18.5 |
20.5 |
26.7 |
Música portuguesa |
18.3 |
18.8 |
21.2 |
19.5 |
17.6 |
Folclore português |
15.0 |
4.8 |
9.1 |
10.9 |
17.6 |
Quando o telefone toca |
11.8 |
1.6 |
4.4 |
2.2 |
3.8 |
Folhetins |
11.0 |
2.1 |
9.5 |
12.1 |
10.6 |
Desporto |
10.7 |
4.8 |
5.6 |
10.7 |
11.1 |
Fados |
10.6 |
5.7 |
5.8 |
7.3 |
12.6 |
Música erudita |
2.7 |
21.8 |
12.4 |
4.1 |
1.0 |
Quadro 12: programas preferidos em relação à audiência de
véspera (1969)[6].
Dez anos depois, com a nacionalização da rádio e o favorecimento da Rádio Renascença com a atribuição da RFM, o panorama apresentava alterações a que se ligavam não só a componente técnica, mas também o quadro socioeconómico resultante do 25 de Abril.
Quadro 13: Fonte: Gabinete de Estudos de Radiodifusão (RDP), 1978Os dois
quadros que aqui se apresentam remontam a épocas e a motivações diferentes da
que me leva aqui a mostrá-los. No entanto, é possível, através deles, verificar
a dificuldade de afirmação do FM em Portugal nas décadas de 60 e 70.
No
quadro dos programas preferidos em 1969, nenhum deles tem transmissão exclusiva
em FM. Por aproximação, podemo-nos fixar na música erudita que, mesmo assim,
também era transmitida em AM. No entanto, dada a especificidade do seu
auditório, pode aceitar-se que o FM era a onda preferida para a sua audição
(2.7%).
Igualmente,
em relação aos emissores que se escutam habitualmente em 1978, os cálculos têm
de ser feitos por aproximação uma vez que uma parte significativa da audiência
não sabia se ouvia em FM ou em AM. De qualquer das formas, são dois
indicadores, muito ligeiros. No entanto, já é possível definir um grande
incremento do FM que já encontra aceitação declarada em quase 30% do auditório
de rádio.
Foi
preciso esperar pela década de 80 para que o FM suplantasse definitivamente a
AM. Os tempos eram outros e tudo corria mais devagar. Cheguei a pensar que não
devia ser necessário esperar 20 anos para que o uso do DAB e de outras
tecnologias de transporte de sinal digital se generalizassem.
Por
outro lado, o que poderá vir a distinguir o digital é uma certa abertura a uma
interactividade mitigada que terá a dimensão que os fabricantes de receptores
(em termos de computadores multimédia, o problema está resolvido) e as empresas
de radiodifusão desejarem. Se estivermos perante uma rádio nova, então a sua
relação com o ouvinte altera-se, passando este a ter um papel não de exclusão,
mas de inclusão no processo comunicativo.
Aquele
tão longo período de formação de massa crítica para o FM, apesar de tudo, teve
como base o lançamento de uma tecnologia barata. Ora o Digital Audio
Broadcasting, DAB, sendo uma tecnologia cara, é de serviço gratuito. A rádio on
line é barata, não precisa de licenças mas tem de pagar o tempo de utilização
da linha telefónica e tem de ter computador (que também não é barato).
Temos
então três aspectos a ter em conta para a formação de massa crítica: o custo da
tecnologia para o operador, o preço dos receptores DAB para os consumidores
(equivalente ao preço de computadores que fazem muito mais coisas) e a despesa
da linha telefónica para os utilizadores da rádio on line. Acrescente-se
que a rádio vale pela sua mobilidade, é portátil, e ainda tem a possibilidade
de ser ouvida em computador via hertziana.
Figura 1: Cobertura DAB em todo o mundo (Fonte: WorldDAB[7])
Temos então três aspetos a ter em conta para a formação
de massa crítica: o custo da tecnologia para o operador, o preço dos recetores
DAB para os consumidores (equivalente ao preço de computadores que fazem muito
mais coisas) e a despesa da linha telefónica para os utilizadores da rádio on
line. Acrescente-se que a rádio vale pela sua mobilidade, é portátil, e ainda
tem a possibilidade de ser ouvida em computador via hertziana.
A rádio, a Internet, a mobilidade e o princípio “free
on air”
Voltando
a citar Faus, e considerando que os Estados Unidos são sempre um ponto de
referência a ter em conta, em 2000, pela primeira vez na história dos
americanos, o número de lares com computador e acesso à Internet superou em dez
pontos o número de assinantes de jornais: 52% e 42%, respectivamente. O que faz
com que, aliado a dados do mercado espanhol, Faus entenda que a rádio on
line se revele com uma audiência potencial importante, em crescimento
acelerado. Note-se que, em Portugal, possuem computador em casa mais de 37% dos
portugueses[8].
No
entanto, o reino da mobilidade já não é domínio exclusivo da rádio. Em 2000, em
Amsterdam, durante o Congresso Internacional de Radiodifusão, equiparam-se
vários “eléctricos” com televisão móvel e ela funcionou impecavelmente.
Portanto, o que começa a ficar claro é que não vai prevalecer nenhum sistema
nem nenhum meio em relação ao outro, e a convergência acabará por ser mais um
sistema. Aliás na sequência do que, nas Jornadas das Novas Tecnologias da RTVE,
em Madrid, foi afirmado por Philip Laven, Director Técnico da EBU/UER: “Haverá
muitos sistemas para entregar serviços e todos competirão entre si”.
Por
exemplo, em relação ao computador, a Sonicboxn iM surgiu como receptor remoto
da rádio on line , com transmissão na banda dos 900 MHz até ao
equipamento áudio ou ao walkman. Evidentemente que o equipamento era
muito mais barato que o DAB, embora faltando contabilizar o preço da utilização
dos circuitos.
Vem desse tempo de início de milénio o entusiasmo de Faus Belau pela radionet, levando-o a afirmar que a “emissora na rede pode proporcionar todos os serviços oferecidos pela Internet e .../... todos aqueles serviços que se incluam na rede no futuro, serão sempre pelo mesmo custo mínimo”. Sendo uma verdade evidente, o certo é que a radionet terá sempre um custo que se prolonga pela sua utilização. A rádio em DAB não apresentaria este ónus, mantendo as características de gratuitidade e de simplicidade de utilização que sempre caracterizou a rádio e com uma qualidade de som CD.
"O princípio do "free-to-air"
aliado ao baixo custo de entrada no mercado alimentou o crescimento da rádio na
última década. Qualquer diluição daquele princípio em relação a serviços
essenciais pode afectar seriamente o crescimento do DAB e ameaçar as
necessidades e os valores da Sociedade da Informação. Ao mesmo tempo, os
radiodifusores deveriam ser dotados de capacidade suficiente para o
fornecimento de serviços de dados para as suas audiências de massa[9]".
A Comissão Europeia mostrava, assim, em 1998, aquilo que
se mostrava com mais evidência ao reforço do papel da rádio na sociedade da
informação. Na verdade, do meu ponto de vista, a rádio digital, nomeadamente na
sua versão DAB, pela popularidade que o meio desfruta, pela sua simplicidade de
utilização e pela intimidade com o receptor, poderia ter sido um factor muito
poderoso para uma participação generalizada na sociedade da informação.
Figura
2: Portugal chegou a ter esta cobertura em DAB (Fonte:
Worldab). Hoje está tudo desligado, na sequência da absorção da RDP pela RTP.
Importa deixar claro que a rádio, por definição, é um
meio de comunicação social, e os mass
media, para o serem, continuarão
a constituir "instrumentos ou
aparelhos técnicos mediante os quais se difundem mensagens — pública, indirecta
e unilateralmente — a um público disperso", conforme a célebre
definição de Paul Ricoeur e que remonta
a 1977[10], mesmo com a
interactividade que as novas tecnologias permitem.
Enfim,
a Internet pode conter a rádio, os jornais e a televisão, mas igualmente é
verdade que, pelo menos, a rádio e a televisão digitais também podem conter a
Internet. E será mais natural que a adesão popular vá mais por sistemas free
on air do que por quaisquer outros que exijam fixidez ou pagamento por
utilização. E isto até por razões de mobilidade da civilização actual, com
grandes espaços de tempo passados em deslocação de uns locais para outros.
Quando
os especialistas se enganam
Voltando
à citação de famosos erros de projecção lembrados por Philipe Laven[11],
em 1876 os responsáveis pelos serviços de telégrafo da Western Union,
defenderam que o telefone tinha demasiadas desvantagens e limitações para ser
encarado a sério como um como forma de comunicação. Ken Olssen, da Digital
Equipment Corporation (mais tarde adquirida pela Compact) disse em 77 que no
havia motivo algum para as pessoas terem um computador em casa. Em 1946, no
advento da TV nos Estados Unidos, Darryl Zanouk, presidente da Twenty Century
Fox, afirmava que a televisão não podia reter e fidelizar o mercado além de
seis meses porque as pessoas rapidamente se cansariam de estar a olhar para a
“caixa tonta” todas as noites. Um dos Warner Brothers, a propósito do
aparecimento do cinema sonoro, disse, em 1927: “A quem é que vai interessar
ouvir como falam os actores!”
Depois de todas estas projecções falhadas, não quero
contribuir para tão vasta lista. Porém, no que à rádio diz respeito, e depois
de 36 anos de uma vida profissional intensa naquele meio de comunicação, julgo
não andar longe da verdade quando afirmava na minha tese de doutoramento que
a rádio em DAB se apresenta, no dealbar do século XXI, como uma criação da
cultura europeia com a previsão de grande importância (ainda insondável nas
suas consequências) para a sociedade da informação em construção.
Por outro lado, o exemplo pioneiro português da Rádio
Comercial na Internet parece ter representado uma experiência do que as
auto-estradas da comunicação podiam abrir à rádio digital[1]. A RDP, por sua vez,
desenvolveu, na altura, o seu site por forma a potenciar um conjunto atractivo
de serviços aos utilizadores. Hoje está perfeitamente vulgarizada a presença de
rádios portuguesas na Internet. E está a verificar-se que o mundo é o limite
para as rádios que conhecem as potencialidades das novas tecnologias. A Internet, sendo
importante, não vai substituir a radiodifusão. Mas tal como outros meios e
outros serviços, também a radiodifusão continuará a recorrer à Internet e até
poderá introduzir alguns dos seus sites nas emissões em DAB.
No
actual momento da rádio digital, convivemos com situações de confronto entre
projectos, entre indústrias, entre mercados, entre conceitos, entre
radiodifusores, entre média e multimédia (e hipermédia), entre políticas de
desenvolvimento, entre a localização e a globalização, entre perspectivas de
exercício da profissão de comunicador (jornalista incluído), enfim, entre
valores.
Face a todas estas discussões, a questão dos conteúdos
corre o risco de ser subalternizada, o que deita por terra toda e qualquer
inovação tecnológica. Se, de alguma forma, o poder está na técnica e nas
constantes inovações que apresenta, não podemos deixar a informação tornar-se
num subproduto tecnológico, levando-nos a consumir técnica e não informação e,
menos ainda, comunicação. Onde está o interesse de consumir técnica
sem lhe corresponderem conteúdos interessantes? Ou regressamos à discussão
inacabada do design sobre se o que deve prevalecer é a forma ou a função?
Para
Merayo[2],
a aposta nos conteúdos parece decisiva para o desenvolvimento da rádio digital
e da rádio na Internet; “provavelmente esta aposta há de ir acompanhada também
de um decidido empenho em melhorar a formação dos profissionais. E concluiu a
sua comunicação “Por eso, y como reflexión final, la pregunta que podemos
hacernos, no sin cierto matiz irónico es: ¿Nos decidimos a reinventar la radio
o seguimos discutiendo de tecnología?”
[1] Melo, R., 1999, O Digital Audio
Broadcasting: implixcações nos conteúdos radiofónicos, tese de doutoramento
in UPSA, Salamanca.
Doctor
en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de
Salamanca
e
licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto
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Navarra: http://www.unav.es/fcom/jornadas2000/Ponencias/ponfaus.htm
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Martinez-Costa, Maria del Pilar,
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http://www.rtve.es/eventos/jornadas/indice.html
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las CCAA, Organizada pela Asociación "Foro de la Radio Digital", no
hotel Eurobuilding, em 15 de Março de 2001: http://www.rtve.es/dab/infor.html
Marktest: http://www.marketest.pt/Informacao/Bareme-Internet/Resultados/dados2000-1.htm
WORLD
DAB FORUM - www.worlddab.org
XV Jornadas Internacionales de a
Comunicación, Reinventar a Rádio, Universidade de Navarra: http://www.unav.es/fcom/jornadas2000/Ponencias/ponfaus.htm
[1] Jornadas de Nuevas Tecnologías:
http://www.rtve.es/eventos/jornadas/indice.html
[2] DRM
(Digital Radio Mondiale): http://www.drm.org/system/globsample.htm
[3]
Williams, F., Strover S., Grant, A. E., 1994: 624.
[4] Massa
crítica é um conceito dos físicos adoptado pelos cientistas sociais para se
referirem ao número de indivíduos que precisam de ser envoltos num movimento
social antes que se efectue uma “explosão” que faça com que este movimento
social se materialize, conforme Olivier, Marwell e Teixeira, 1985:522 a 556.
[5] XV Jornadas Internacionales
de a Comunicación, Reinventar a Rádio, Universidade de Navarra: http://www.unav.es/fcom/jornadas2000/Ponencias/ponfaus.htm
[6] Maia,
1995: 322.
[7]
WORLDDAB
FORUM - www.worlddab.org.
[8] Conforme o Bareme Internet em http://www.marketest.pt/Informacao/Bareme-Internet/Resultados/dados2000-1.htm
[9] Subcomissão DGXIII e DGX, Bruxelas 1998 (in WorldDAB
Forum: - www.worlddab.org.
[10]
Citado por Beltrão e Quirino, 1986: 117.
[12] Melo, R., 1999, O Digital Audio
Broadcasting: implixcações nos conteúdos radiofónicos, tese de doutoramento
in UPSA, Salamanca.
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