A credibilidade da voz como aspeto persuasivo de criação
radiofónica
M.
Julia González Conde
Doctora
en Periodismo (UCM). “Información universitaria en la radio pública”.
Reflexões vertidas para aulas por
Rui de Melo
Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na
Universidad Pontificia de Salamanca e licenciado em Direito pela Universidade
Católica do Porto
Professor Associado, aposentado, da Universidade Fernando
Pessoa
Pegando
na ideia de M. Julia González Conde, senti-me acompanhado no meu inconformismo
em relação a vozes desajustadas, leituras confusas e anomalias linguísticas
que, sobretudo no âmbito informativo, em particular, comprometem a
credibilidade de quem fala.
Como a
palavra falada encerra muitos aspetos analisáveis, a autora elaborou um
trabalho de campo com o objeto de determinar diferentes formas de fala em
várias profissões, escolhidas pela sua necessidade de ser credíveis.
1. Voz, credibilidade e efeitos persuasivos
Pode-se
enquadrar a voz dentro dos estímulos externos que, como afirmam muitas
correntes de investigação e já diziam Demócrito, Platão ou Aristóteles como
componentes de perceções inconscientes, provocam processos psíquicos que afetam
e estimulam a nossa conduta à margem da nossa vontade. É a perceção subliminar de
que tanto se fala no campo publicitário.
Através
de uma voz de procedência oculta e que emerge de um aparelho de rádio,
percebemos mensagens que os nossos olhos não vêm, mas a nossa mente constrói.
Muitas vezes, a perceção não é consciente porque a recebemos sem resistência
alguma, o que supõe um grande perigo sobretudo se existem informações
conotativas associadas a valores políticos, sociais ou culturais, difíceis de
ajuizar.
As
mensagens radiofónicas tentam conseguir a máxima efetividade e significação no
menor tempo possível; oferecendo, além disso, todas as armas persuasivas
necessárias de atração do ouvinte a um ritmo demasiado acelerado para o
conhecimento consciente.
Não há tempo para a reflexão.
Assim,
outros fatores utilizados na linguagem radiofónica como a repetição de ideias e
termos, a sobrecarga informativa, a falta de previsão da mensagem recebida ou o
mascaramento de certos conteúdos com a incursão de elementos musicais ou
efeitos de som, introduzem o discurso radiofónico nas técnicas subliminares,
dispostas a conseguir um efeito imediato.
Se a
tudo isto lhe juntarmos o ingrediente de uma voz radiofónica, pessoal e
sedutora, as consequências efetivas não deixam lugar à dúvida.
2. A Voz como comunicação afetiva
O meio
de comunicação que mais se consome é a televisão. Contudo, há um dado muito
interessante segundo o qual mais de metade da população que ouve a rádio
considera que as notícias que se dão neste meio lhe merecem bastante confiança.
Isto é, vê-se mais televisão mas confia-se mais na rádio. A confiança e a
credibilidade estão juntas, sendo os motivos pelos quais um meio ou outro tem
mais ou menos êxito e, apesar desta asseveração, são poucos os autores que
tocaram a questão da credibilidade e o porquê da sua existência. São aspetos
que se tratam de passagem no momento de explicar as questões teóricas, sem as
aprofundar. Portanto acreditamos que se torna necessário um estudo da questão;
contudo, as investigações têm-se centrado fundamentalmente nas técnicas a
seguir e na correta forma de as aplicar e não no que se obtém delas, isto é, na
credibilidade que se projeta tendo em conta o emissor e a forma como delas faz
uso.
A
investigadora analisou a forma de falar de diferentes personagens, que
representam diferentes profissões, com o fim de ver como aplicam as técnicas
necessárias para conseguir uma maior credibilidade e analisar se se conseguiu
ou não.
Evidentemente,
nem toda a gente tem as mesmas características físicas (diferentes vozes, todas
únicas e com qualidades diferentes) nem a mesma predisposição para a
comunicação; contudo, é conveniente saber que existem técnicas e regras que se
devem seguir para potenciar o êxito da mensagem. Deste modo, poderíamos dizer
que qualquer voz pode chegar a ser credível se utilizar e dominar uma série de
conhecimentos e técnicas expressivas, além de uma atitude adequada ao conteúdo
do seu discurso.
3. Qualidades expressivas da Voz
Da
mesma maneira que não há duas impressões digitais iguais, não há duas vozes
idênticas. Cada voz tem um colorido próprio e inimitável, que é o que a torna
única; uma série de características que a diferenciam das demais. Sendo verdade
que as vozes se podem imitar, a emulação nunca chegará a ser exatamente igual
ao modelo imitado.
Estas
qualidades são a intensidade, o tom e o timbre, embora haja alguns autores,
como Emma Rodero (2003:41), Cármen Pérez e Arturo Merayo (2001:79), que incluem
“a duração” como uma quarta qualidade nesta classificação.
A
intensidade da voz equivale ao volume e é a força ou potência de emissão das
vibrações que procedem das cordas vocais. É a energia com que o ar é
impulsionado desde os pulmões para as cordas vocais. Desta forma, se falamos em
voz baixa, a intensidade é muito débil, enquanto se falamos em voz alta a
intensidade será maior e necessitaremos de respirar com maior frequência. A
intensidade baixa corresponde às sensações de tranquilidade, intimidade,
tristeza ou proximidade; à intensidade alta associamos alegria, raiva,
agressividade ou ânimo.
Conforme
a atitude do falante, o seu estado físico e sentimental e as circunstâncias em
que se encontre, a intensidade será maior ou menor, podendo inclusivamente
variar durante o discurso; isto faz com que a carga emocional de uma pessoa se
transmita através desta qualidade. Não obstante, também é preciso ter em conta
o que se vai dizer, já que para um relato íntimo não se utiliza a mesma intensidade
que se usa numa reunião social.
Assim,
variar a intensidade quando se fala permite reter a atenção dos ouvintes e
evitar a monotonia; além disso, também serve para diferenciar os sentidos de
uma mesma palavra conforme se enuncia o som.
No meio
radiofónico, os comunicadores devem ter em conta que, dada a sensibilidade que
os microfones têm, não é necessário aumentar demasiado a intensidade quando o
discurso o requeira, basta que subam um pouco o tom de voz. De contrário,
produz-se a saturação do som e a mensagem fica incompreensível e, portanto,
pouco credível. Desta forma, a sensação que o ouvinte percebe será similar à ouvida
se realmente se tivesse aumentado a intensidade (como se o locutor num momento
determinado, desse mais importância às palavras do discurso).
Ao
ouvir certos apresentadores de televisão (que evito aturar), parece que “desconhecem”
que há amplificadores de som e que não é preciso gritar, causando irritação ao
ouvinte normal. A falta de cuidado na seleção das vozes tem dado passo a vozes de
falsete de uma tal tonalidade aguda que confunde a identificação de género.
O tom
(agudo ou grave) é a altura ou elevação da voz que resulta do número de vezes
em que as nossas cordas vocais vibram. Quantas mais vibrações (maior
frequência), mais aguda é a voz e mais alto o tom; pelo contrário, quantas
menos vibrações (menor frequência), mais grave é a voz e mais baixo o tom.
Desta maneira, o tom permite classificar o som em mais agudo ou mais grave.
De
forma geral, o falante, seja homem ou mulher, terá um tipo de tom. As vozes
graves são associadas aos homens e aos qualificativos de “séria”, “segura” ou
“adulta”. As vozes médias e, sobretudo agudas, são associadas às mulheres e
consideramos como mais “infantis”, “suaves”, “doces”, “familiares” e “alegres”.
Todas, tanto masculinas como femininas, têm um tom, denominado “meio-tom”, que
é o que usam habitualmente, e todas se podem mover numa escala de graves e
agudos.
O
estado de ânimo e a atitude do falante são qualidades da voz que determinam a
sua forma. Assim, os sentimentos do emissor da mensagem transmitem-se através
do tom com que fale. Por isso, é muito importante que os locutores
(comunicadores, informadores, jornalistas) radiofónicos aprendam a controlar as
suas emoções e o tom com que falam. Por outro lado, uma mensagem alegre poderia
parecer triste, e vice-versa, diminuindo a sua credibilidade.
É
recomendável também, e assim Arturo Merayo (meu professor no curso de
doutoramento) considera que, para obter um melhor resultado seja o próprio
redator da informação a dizê-la, posto que saberá com que intenção escreveu
cada palavra e o tom que deve empregar para isso.
O
timbre, que juntamente com o tom e a intensidade, a chamada “cor da voz”, é a
qualidade que nos permite distinguir uma voz de outra ao ouvi-las. O timbre é o
que faz com que uma voz seja agradável ou desagradável, e a partir daí, os
ouvintes de rádio têm uma ideia própria de como é o rosto do locutor, já que
tendemos a associar certas características físicas a determinados tipos. De
facto, a constituição física (cara, queixo, dentes, palato, alvéolos ou nariz)
determina um timbre determinado. Por isso, é normal que os membros de uma mesma
família tenham timbres parecidos. De qualquer maneira, a voz é como o DNA das
pessoas, não há dois iguais. Embora se possa modificar (variando as dimensões e
a forma da cavidade bucal ou corrigindo as tensões dos músculos da laringe e
respiratórios, entre outras fórmulas), por exemplo, para fazer imitações, o
timbre é que faz com que cada voz seja única. Além disso, há diferentes tipos
de timbre que o falante emite em função da sua atitude e do seu estado de ânimo
(tal como com as demais qualidades). Se quem fala está alegre e feliz, o timbre
será brilhante; se está triste ou tem medo, será opaco; se fala com
normalidade, será absoluto; se transmite poder, energia ou certeza, será
rotundo e se diz frases confidenciais ou amorosas, o timbre é apagado, quase
ausente.
Portanto,
é conveniente que o comunicador na rádio domine tanto esta qualidade como as
demais. Para isso, necessita de educar e treinar a sua voz e, uma vez que o
tenha conseguido, a sua credibilidade e a sua expressividade serão maiores.
Um
quarto fator que é introduzido por alguns autores, é a duração. Uma qualidade
que faz com que os sons sejam apreciáveis devido à sua extensão num período de
tempo. Se o som tivesse uma duração de um milésimo de segundo não seria
percetível ou não o identificaríamos. Cada pessoa tem uma velocidade média
própria (uma duração própria) quando fala. Para compreender uma locução, a
velocidade média da fala é de entre 125 e 190-200 palavras por minuto,
incluindo velocidades lentas e rápidas (Rodero, 2003: 206-214). A duração da
voz está em função da quantidade de ar que sejamos capazes de armazenar nos
pulmões para logo o expirar na leitura, e este processo é diferente em cada
indivíduo. Por isso, é importante que qualquer comunicador saiba qual é a sua
capacidade, já que influi no ritmo da locução e, com isso, na leitura do seu
discurso. Se não armazena suficiente ar, terá que parar, ao acaso, quando o
corpo o exigir, a meio da frase para respirar de novo. Desta forma, a mensagem
perde sentido, o que não contribui positivamente para a credibilidade do seu
conteúdo nem da do informador.
O
estado de ânimo também é uma parte muito importante quando falamos e que não se
deve descuidar, já que a velocidade em que nos expressemos depende de se
estamos contentes e felizes (duração menor, falamos mais rápido) ou de se
estamos tristes (duração maior, falamos mais devagar). Os ouvintes percebem-no
e, assim, obtêm informação do estado anímico do informador.
3.1. A voz conforme a sua tonalidade
Há
muitos tipos de vozes e fizeram-se diferentes classificações atendendo a
diferentes aspetos da voz. Para o estudo da professora Júlia, ela escolheu a
disposição segundo o tom, que é a qualidade da voz que permite distinguir as
femininas das masculinas, além de diferenciar os sons agudos dos graves.
As
vozes graves, em geral, valorizam-se mais que as médias ou as agudas, sejam
masculinas ou femininas, embora quanto a estas últimas existe uma maior
tolerância se não são tão graves. Uma voz grave é mais intensa e, segundo
Rodero (10/05/05) “a voz força-se menos e pode-se falar durante mais tempo sem
sobre-esforço”. É uma voz agradável porque é cálida e próxima para o ouvinte
além de trazer segurança e tranquilidade, algo que se valoriza em grande
medida. Por isso, uma voz grave “percebe-se como mais segura e credível”.
(Rodero, 10/05/05)
Por
outro lado, o autor Rodríguez Bravo[1], diz que “o locutor construirá uma voz
muito melhor aceite pelos ouvintes sempre que procure falar situando-se
acusticamente em torno dos seus registos mais graves.”
Segundo
o estado de ânimo do falante (homem ou mulher), a sua voz será mais ou menos
grave. Os estados de ânimo que se associam ao tom grave são a tristeza, a
tranquilidade, ou o abatimento. Também uma voz determinada poderá utilizar-se
para criar ambientes mais ou menos íntimos.
As
vozes graves nos homens caracterizam-se por ser muito masculinas, têm muito
volume e grande sonoridade e alguns autores descrevem-nas como “robustas e
poderosas”.
As
vozes médias são as mais comuns, as que estamos mais habituados. Dentro desta
categoria podemos encontrar vozes médias-agudas, vozes médias e vozes médias
graves. Este tipo de vozes tem a vantagem de se poder modular dentro de uma
gama mais ampla de tons quer de vozes agudas ou de vozes graves, o que dá lugar
a uma maior variedade.
São
mais ricas, tonalmente falando. Isto faz com que a audição da mensagem, por
parte do ouvinte, seja mais agradável, mais amena e, portanto, se preste mais
atenção ao conteúdo da informação.
Referência disponível on line
https://www.ucm.es/data/cont/media/www/pag-79436/cv_julia_gonzalez.pdf
Citado por Rodero Antón,
Emma em “A voz informativa radiogénica”. Em Revista mexicana de Comunicação.
Disponível em http://www.mexicanadecomunicacion.com.mx/Tables/RMC/rmc79/voz.html
Citação recolhida por Rodríguez Bravo,
Ángel Andrés (1989),
a construção de uma voz radiofónica. Tesis Doctoral,
departamento de Comunicação
Audiovisual e Publicidade da Universidade Autónoma de Barcelona,
Barcelona.