O tom coloquial da rádio e da televisão

O tom coloquial da rádio e da televisão



Reflexões vertidas para aulas por
Rui de Melo
Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de Salamanca e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto
Professor Associado, aposentado, da Universidade Fernando Pessoa


O falante de rádio é eficaz quando não se limita só a dizer, mas quando ao dizê-lo realiza uma ação; então são muito claras as suas intenções de comunicar, de entrar em relação com o ouvinte, com o seu interlocutor, através de atos de fala em que se consegue algo (perlocução); porque se convenceu, se persuadiu, não se obrigou. Porque é ele ou ela quem fala, quem diz e não outro. A linguagem oral caracteriza-se pela sua construção simultânea com o pensamento. Elabora-se em situação; é um raciocínio que se vai fazendo. Embora a sua finalidade seja convencer, informar, interrogar, também é ouvir e deixar-se convencer, inteirar-se e responder.

A linguagem radiofónica estrutura-se com base na linguagem coloquial, familiar, próxima, e por essa razão penetra no ouvinte. A rádio é um meio que nos convoca, nos chama e, embora o faça pessoalmente, de forma íntima, somos muitos, uma comunidade social a ser convocada pela mensagem. Graças a esse carácter pessoal e social ao mesmo tempo, a linguagem radiofónica, composta pelos elementos sonoros necessários, é capaz de suscitar, por força das palavras, a sua capacidade de receber o que tem significado comum e a experiência própria dos interlocutores, a presença de factos, sentimentos, factos passados; evocar o que tem sentido.

A notícia deve transmitir certeza, segurança e credibilidade ao ouvinte. O jornalista de rádio deve ser bem formado e sempre atualizado para não cometer erros gramaticais ou pronunciar palavras estrangeiras de maneira incorreta. Essas falhas comprometem a credibilidade do jornalista de rádio.

Porém, Emilio Prado, teórico estudioso de rádio defende que a naturalidade na fala do jornalista de rádio implica alguns equívocos que podem deixar a relação jornalista de rádio-ouvinte mais expressiva.

Preocupado com a estética das “máquinas falantes” que eram os locutores “em pose” que, do alto do se fazer, produzia um efeito distanciador. E, se neste aspeto, estamos completamente de acordo, discordo em absoluto do que o estudioso espanhol considera na sua obra “Estrutura da informação radiofónica”

(...) Como alternativa para essa atitude surge a estética do erro que consiste na repetição de erros premeditados. Esta ação produz uma aproximação entre emissor e recetor, uma certa cumplicidade amigável e, em definitivo, uma humanização da expressão que favorece a criação de um clímax comunicativo. É preciso insistir no fato de que esses erros, para que cheguem a uma estética, não podem ser muito abundantes (...). (PRADO, 1985, P. 21)

Além desses possíveis (mas acidentais) erros, um jornalista de rádio deve estar sempre preparado para o improviso, tendo em mente o que estudou no material de apoio das informações para um eventual momento de improviso. Isso é fundamental na linguagem da rádio. Na apresentação da notícia e no comentário do fato, na reportagem, a boa construção do improviso assenta no conhecimento de cada comunicador.

Um bom improviso ajuda a ultrapassar situações inesperadas. Pode usar-se o bom humor, mostrando-se naturalmente descontraído diante da situação e evitando o uso de “bengalas” ou “frases feitas”.

O improviso treina-se. Na minha preparação procurava imaginar-me em diversas situações e o que faria para me livrar delas. Viajando em transporte público, ia narrando para mim mesmo o que via. Ia à janela dos estúdios da Rua de Ceuta, no Porto, e descrevia o que se passava. Ia ver um jogo de futebol ou de hóquei e fazia o relato para mim mesmo.  Ia memorizando alternativas de improviso de grande utilidade sempre que precisei de improvisar na minha carreira profissional. Na deslocação para um exterior, o profissional deve documentar-se por formar a dominar o objeto da reportagem. Leva-se sempre um pequeno roteiro do que se vai falar, estabelecendo, por exemplo, uma ordem de importância.

Define-se o começo, o meio e o fim da ideia a ser exposta e procura-se ser mais abrangente do que específico, evitando gírias que comprometam o português culto.

Há outros aspetos a ter em conta numa transmissão do exterior:

Evitar o excesso de entusiasmo, embora seja necessário cativar a atenção do ouvinte, independente do assunto transmitido.

O jornalista de rádio precisa de ser o mais claro possível para que o ouvinte entenda a mensagem transmitida, dada a efemeridade do som.

Durante a locução é preciso mostrar aos ouvintes quais são os fatos mais relevantes por meio da ênfase de que se dota a entonação. É através desta que o jornalista de rádio dá o tom à notícia.

É preciso saber usar a inflexão da voz.  A entonação de frases varia e cabe ao jornalista de rádio marcar essas distinções na fala.

A locução deve ser natural, sem demonstrar que o jornalista de rádio está a ler. A voz deve estar livre, sem demonstrar tensões.

É preciso saber usar a pausa para facilitar a compreensão pelo ouvinte e também ajuda a dar entonação e ritmo ao texto.

A serenidade é precisa para passar essa sensação para o ouvinte. A pressa ou o nervosismo não podem estar aparentes na locução.

O jornalista de rádio dita o ritmo do texto. Sem essa cadência a notícia fica monótona e cansativa. Cada tipo de texto tem o seu próprio ritmo.

Para que o ouvinte se sinta atraído pela informação, tem de entender o que estamos a dizer. Devemos usar uma linguagem sem muitas formalidades, mas ao mesmo tempo rica em variações. Raramente os ouvintes param para ouvir rádio. Na maioria das vezes a audição acontece durante outras atividades, mais uma razão para a linguagem ser fácil e objetiva.

É importante também que o jornalista de rádio estabeleça um estilo próprio para que seja reconhecido pelo ouvinte.

 

24/03/2021

Rui de Melo

 

Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de Salamanca

e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto

 

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