Ver aqui
https://drive.google.com/file/d/1FyOnsPBIOnKHO5mSLVM4_J2jqkKm8hUT/view?usp=sharing
Dezenas de anos de rádio dão muito que contar. É o que estou a fazer. Portuense Rádio Clube, Rádio Porto, Electro-Mecânico (E. do Norte Reunidos), Rádio Alto Douro, Rádio Clube Português, Rádio Clube do Uíge, Rádio Clube de Angola, Rádio Renascença (desporto), RDP, Antena 1 e Rádio Comercial foram portos da minha viagem de mais de 40 anos pela rádio. Em 1996, optei pelo ensino superior, fazendo o doutoramento na U. Pontificia de Salamanca. Lecionei no ISCIA, em Aveiro, na ESAD, e na UFP.
Ver aqui
https://drive.google.com/file/d/1FyOnsPBIOnKHO5mSLVM4_J2jqkKm8hUT/view?usp=sharing
“Estética do erro”
Alguns
teóricos, como Emílio Prado, falam numa “estética do erro” (1989, p. 21)[1],
uma expressão retirada do jazz e do improviso, como contraponto a uma leitura
impecável, que – de tão perfeita – poderia ter um efeito distanciador no ouvinte.
A “estética do erro” significa, mais do que cometer erros premeditados (ou
seja, o jornalista de rádio ao escrever já calcula onde se vai enganar de
propósito...), deixar campo aberto para que eles apareçam... naturalmente. O
conceito pretende produzir uma “aproximação entre emissor e recetor, uma certa
cumplicidade amigável e, em definitivo, uma humanização da expressão que
favorece a criação de um clímax comunicativo” (Prado, 1985: 21, apud Meneses,
2012: 49)[2].
Quando se pede
clareza, o jornalista vai provocar erros de leitura porquê? Diz a “estética do
erro” que uma leitura perfeita pode ter um efeito distanciador no ouvinte. E a
leitura com erros aproxima o ouvinte? Aliás se a estética é a filosofia da arte
que, por sua vez, procura o belo nunca pode condescender com a provocação do
erro.
Quando se
espera credibilidade das notícias, a provocação do erro não a compromete? Se o
jornalista se engana, tropeça nas palavras, acrescenta-lhe sons estranhos reúne
condições para ser credível? Ou, pelo contrário, compromete essa credibilidade,
provocando o erro, levando o ouvinte a rejeitar tal manifestação de insegurança
que o faz pensar que quem assim age não sabe do que fala e, portanto, não
interessa.
O que se exige
é uma leitura coloquial, que transmita proximidade e que conquiste a confiança
de quem ouve. Um impulso de afeto. A provocação do erro subverte a relação de
naturalidade com o ouvinte.
Consequentemente,
a eficácia da mensagem é grande se excluir o tom académico, doutrinário,
palestrante que faz com que, em especial alguns comentaristas, apareçam ante o
ouvinte como um mestre, um clérigo ou um juiz.
As notícias
(género básico de informação) têm características peculiares na rádio. Reúne
condições elementares de veracidade, novidade, atualidade e interesse geral,
bem como as respostas às seis perguntas clássicas
quem?
O quê?
Quando?
Onde?
por quê?
Concisão, frases curtas, preferir o presente ao passado, a voz ativa à passiva. Repetição pontual de tópicos numa redação em espiral. Às vezes, é necessário fornecer ao ouvinte pontos de referência. Se a notícia for longa, o lead pode ser repetido, resumido, entre os detalhes da exposição. O lead é a entrada ou o início de informações com seus principais dados resumidos. A voz do comunicador acrescenta um elemento pessoal e diferenciador. Também permite o uso de ênfases, pausas e mudanças no ritmo da leitura.
Exemplo de notícia em espiral
“A rádio não
evoluiu; adaptou-se” (Meneses, 2012: 159). “Ou seja: a rádio, de ontem e até de
hoje, pode definir-se como um conteúdo sonoro (palavra e/ou música)
predeterminado por alguém (a direção de programas ou o autor) para ser ouvido
(através de difusão hertziana terrestre ou outra, como o cabo, o satélite ou
mesmo a Internet) por muitos (nos mais variados tipos de recetores),
passivamente (o luxo é linear, irrepetível e não manipulável)” (ibidem, 2012:
162).
“O
erro verbal é uma primeira dimensão do fator de clareza do som, que geralmente
mostra um erro na leitura das notícias escritas anteriormente; mas também um
defeito de articulação ou dicção, uma atitude insegura, uma formulação
incorreta, complexa e confusa. Estes elementos questionam a formação
profissional do jornalista, como se ele não dominasse todos os instrumentos de
sua profissão. O ouvinte julga naquele momento a credibilidade daquele que não
demonstra conhecer todos os elementos da sua tarefa profissional, com base num
estímulo informativo, com uma má estrutura sonora, pouco inteligível ou pouco
agradável ao ouvido” (Balsebre, 1994a: 56)[1].
Para um
jornalista de rádio cujo instrumento principal é a sua voz, a articulação dos
sons deve ser perfeita, pois implica que os seus recetores possam captar a
mensagem em toda a sua extensão[2].
O jornalismo
radiofónico não dispensa a objetividade e não aceita exageros de subjetividade.
Tudo tem a ver com as características do suscetível de ser notícia,
naturalmente, paredes meias com a linguagem utilizada pelo jornalista.
É verdade que
da rádio se espera uma linguagem lúdica, afetiva, recriadora da realidade.
Luís Filipe
Costa, nas conversas que fomos tendo, chamava-me a atenção para nunca divagar,
concretizar, ir direto ao assunto. Com o tempo, fui aprendendo que devia
trabalhar um texto dinâmico, na busca do concreto, com riqueza informativa e
potencial afetivo, provocando recordações, emoções e sentimentos.
Barthes falava
da característica polissémica do texto informativo que implica uma cadeia
flutuante de significados entre os quais o recetor pode escolher uns e ignorar
outros, é o fundamento textual da capacidade ressignificadora do recetor.
Há que escrever
pensando numa perceção associativa, ou seja, o ouvinte associa sincronicamente
vários códigos: imagem auditiva, palavra, som.
Sobre a eterna
questão da objetividade nunca me deixei embalar na discussão do “sexo dos
anjos”. A prática, os colegas e os ouvintes exigiam um comportamento preocupado
com a verdade. Sempre pensei que a veracidade
se liga à pesquisa da verdade, ao caminhar na sua direção, fazer tudo para
chegar lá. É a qualidade que distingue o jornalista responsável - ser credível
perante o público.
Uma vez,
estando de serviço em Sunderland, enviei uma crónica sobre um incidente num
shopping, que envolvia jogadores da equipa que eu acompanhava. Filipe Costa
disse-me, depois, que não tinha deixado ir para o ar a minha crónica. Concordei
com ele porque, no “calor do momento”, eu tinha desprezado o princípio da
imparcialidade. Aprendi com ele que não basta contar a verdade dos factos e ser
objetivo. Se não for imparcial, tudo se desmorona. Objetividade, verdade
(veracidade) mas também imparcialidade.
A garantia de
imparcialidade começa na seleção do objeto relevante da informação determinada
pelo direito do ouvinte a ser informado, não por interesses, favores ou
privilégios. E, claro, com a apresentação de todos os pontos de vista, cuidando
da neutralidade de seleção dos testemunhos.
Retomando o fio
condutor, reconhecemos nas notícias na rádio (género básico de informação)
características peculiares. Aí se encontram as condições elementares de
veracidade, novidade, atualidade e interesse geral. Nunca consegui ver a
informação fora de uma perspetiva estética. Rudolf Arnheim e a sua Estética
Radiofónica ajudaram a reforçar ideias. A partir do intertexto teórico e
estético dos anos 1930, começa uma fenomenologia precisa da rádio. Era McLuhan
que falava sobre o "espaço acústico da rádio". O espaço de interação
centralizado pelo narrador oral cria um ambiente intuitivo centralizador de um
imaginário cultural. A oralidade mediada pela rádio, sem essa centralidade
sensorial, tem que caminhar na partilha de uma imagem acústica criada no espaço
acústico com as características de invisibilidade, simultaneidade,
envolvimento, inclusão, integração, de modo a constituir o espaço como meio
envolvente.
A noção de
meios como extensão sensorial constituiu a grande hipótese que McLuhan explorou
na questão fundamental: a mudança de perceção como possibilidade única que a
cultura elabora para alterar os seus processos cognitivos.
Menezes diz que “Quase
tudo se resume, na rádio, a falar e a escrever (e a ler, mas disso tratamos
mais à frente) de modo a que o ouvinte nos entenda, de princípio a fim, com o
mínimo de distração (o “ruído”).”[3]
É ele que
afirma com propriedade que
“o jornalismo –
principalmente o da rádio – tem de ser direto, curto, incisivo e linear (sem
que se torne básico ou vulgar).”
Credibilidade significa "tomar como certo algo que o
entendimento não alcança ou que não está provado ou comprovado".
É muito importante acreditar que o que nos é dito é verdade, que
as notícias e acontecimentos são verdadeiros e que quem nos comunica merece a
nossa confiança.
Tendemos a acreditar no que está de acordo com as nossas próprias
crenças, experiências, desejos, preconceitos ou esperanças e, portanto,
colocamos a nossa confiança nos informadores que têm o nosso modo de pensar
sobre diferentes aspetos da vida. Embora isso não signifique que os outros não
sejam confiáveis, o nosso comunicador escolhido será mais aceite porque
depositamos nele a nossa confiança. É por isso que a confiança é tão importante
para se ganhar credibilidade, não apenas para alcançá-la, mas também para a manter.
Voltando à ideia inicial, se se pede clareza, o jornalista não
pode provocar erros de leitura. Uma leitura perfeita tem um efeito de
credibilidade no ouvinte. E a leitura com erros afasta o ouvinte. Aliás se a
estética é a filosofia da arte que, por sua vez, procura o belo nunca pode
condescender com o erro. A provocação do erro compromete a credibilidade das
notícias. Se o jornalista se engana, tropeça nas palavras, acrescenta sons
estranhos não reúne condições para ser credível. Ao comprometer essa
credibilidade, leva o ouvinte a rejeitar tal manifestação de insegurança que o
faz pensar que quem assim age não sabe do que fala e, portanto, não interessa.
Reflexões
vertidas para aulas por
Rui de Melo
Doctor en
Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de Salamanca
e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto
Professor
Associado, aposentado, da Universidade Fernando Pessoa
Referências
BALSEBRE,
Armand, El lenguaje radiofónico, Madrid: Ediciones Cátedra
Díaz Rodríguez,
La educación de la voz radiofónica,
Universidad de Sevilla. Departamento de Comunicación Audiovisual,
Publicidad y Literatura, 2014
Meneses, João
Paulo, “Estudos sobre a Rádio”, Mais Leituras Editora, 2012
Meneses, João
Paulo, Jornalismo radiofónico, Formato eBook, 2016, dezembro
Prado, Emílio, Estrutura Da Informação R
[1]
BALSEBRE, Armand, El lenguaje radiofónico, Madrid: Ediciones Cátedra
[2] Díaz
Rodríguez, La educación de la voz radiofónica,
Universidad de Sevilla. Departamento de Comunicación Audiovisual,
Publicidad y Literatura, 2014
[3]
Meneses, João Paulo, Jornalismo radiofónico, Formato eBook, 2016, dezembro
Eufonia ou a harmonia das vozes na Rádio e na Televisão
Em 17/18 março 2005 participei no IV Congresso Luso-Galego de Estudos Jornalísticos e no II Congresso Luso-Brasileiro de Estudos Jornalísticos
Convidado a apresentar uma comunicação, escolhi “Eufonia ou a harmonia das vozes na Rádio e na Televisão”
É esse trabalho que reconstruo.
A reflexão que
aqui se deixa é fruto de dezenas de anos de prática e da observação que se tem
feito ouvindo a rádio e a televisão que se fazem em Portugal. É preocupante a
leviandade com que a língua é tratada na sua expressão oral por quem serve,
apesar de tudo, de referente a uma população que, fundamentalmente, ouve e vê
informação mediática (e raramente lê). Rádios e televisões de dimensão nacional
descuidam-se na utilização da voz, da fala, da fonética e, por arrastamento,
comprometem a credibilidade do emissor. Quem acredita em alguém que, quando
quer informar, hesita, tropeça, mastiga, empastela aquilo que está a dizer? Não
será esse conjunto de “hums”, “mnhes”, “ããããs” uma fonte incomodativa de ruído,
fruto de quem não está convencido do que informa, resultado expressivo de quem
está inseguro? É uma espécie de moda que só pode ter sido lançada por quem não
gosta de rádio e quer dela afastar tudo o que seja ouvinte.
Podemos definir
eufonia como uma emissão verbal harmoniosa e agradável ao ouvido. Do grego eu,
bem ou bom, e fonos, som, voz. À eufonia opõe-se a cacofonia (do grego cacos,
mau, feio, defeituoso, e fonos, som, voz). Eufonia é também um efeito rítmico e
harmónico agradável produzido pelas sequências fónicas de um sintagma, de uma
microestrutura textual. Eufonia significa, assim, som agradável, escolha
harmoniosa dos sons, suavidade de pronúncia. Efetivamente, o que se diz na
rádio ou na televisão deve soar bem, além do comunicador o dizer bem.
A eufonia (a
harmonia, a agradabilidade) deve ser, pois, uma finalidade do som em geral e da
rádio e da televisão muito em particular, já que marca uma relação que, para o
ser, tem de constar de satisfação mútua, dotar o ouvinte/espectador do sentido
da fruição, para que se sinta bem com o meio de comunicação. A rádio e a
televisão têm de assumir em todos os momentos que a voz, acima de todos os
outros elementos (música, efeitos, silêncios, imagem ou dados), é a garantia
sonora da compreensão mútua e do entendimento com os ouvintes/espectadores.
A propósito da
questão da linguagem radiofónica, por exemplo, considerando a rádio como meio
de difusão, comunicação e expressão, implica que se privilegie a expressividade
e o papel a desempenhar pela palavra mediada pela voz, pela música, pelos
efeitos sonoros e pelos silêncios. Pegando no conceito de eufonia, ligado à
agradabilidade do som da voz, alarga-se à harmonia que deve enformar a
expressividade radiofónica. As potencialidades abertas pela digitalização
apresentam-nos a rádio e a televisão como multimédias, o que levanta a questão
dos conteúdos que, cada vez mais, pedem ao comunicador de rádio ou de televisão
um permanente exercício da criatividade e alargada pela vertente interativa.
Pude aqui
descobrir duas das funções da linguagem de que fala Jackobson. A função fática
ao procurar estabelecer e manter a atenção do ouvinte, em que o prazer de
comunicar quer dos criadores (emissor) quer do ouvinte (recetor) estabelece uma
comunhão de interesse e atenção partilhados. A função metalinguística, do
código, em que os criativos numa linguagem radiofónica, por certo arbitrária,
mas que se afirmou naquele específico contexto social. Aliás, a necessidade de
passar informação que apelasse à inteligência para uma descodificação do
sentido verdadeiro, era um recurso utilizado com frequência para iludir a
censura.
O profissional
de rádio tem de ter presente que é pela voz e pelo ouvido que o homem adquire o
seu estatuto de sujeito. Ouvir alguém na rádio é ouvir a sua voz e, cada vez
que o ouvinte concentra a sua atenção na escuta, deixa ecoar dentro de si a
fala do outro. É pela voz que o ouvinte vai descobrir o "não dito", o
sentido profundo da mensagem. Se o profissional não tem consciência disto, as
suas palavras ficam vazias. Ao abdicar da coloquialidade está a colocar o
ouvinte à distância. Não comunica com ele. O afeto deve passar através da fala
num esforço permanente do profissional da rádio fazer sentir ao ouvinte de que
está com ele e que partilha um código de compreensão, ou seja, de comunicação.
"A voz
permite que a linguagem fique retida no corpo do sujeito sem se alienar:
inversamente, garante à linguagem o seu peso como matéria, sem o qual se
converteria apenas em código vazio". Isto leva-me a deduzir, sem
dificuldade, que a eufonia, a harmonia, a agradabilidade deve ser uma
finalidade do som em geral e da rádio muito em particular, já que marca uma
relação que, para o ser, tem de constar de satisfação mútua, dotar o ouvinte do
sentido da fruição, para que se sinta bem com a rádio.
"Al
margen de que la palabra que se difunde sea improvisada o leída, escrita por
uno mismo o por otro, de carácter sugestivo o meramente informativo, el primer
contacto sensitivo del oyente con el emisor es la voz. Ella es la que
identifica y sitúa psicológicamente al
hablante en la mente de quienes se encuentran al outro lado del recetor"
(Muñoz y Gil, 1986: 53)
Aqui têm
influência três fatores fundamentais: a vocalização, a entoação e o ritmo.
Quanto à vocalização, basta referir que uma pronúncia deficiente dos fonemas
tem como consequência imediata a perda da clareza da mensagem.
A entoação diz
respeito ao facto de a linguagem oral incorporar uma musicalidade que, através
do timbre, do tom e da intensidade da voz (convenientemente modulada)
transporta maior carga semântica e possibilidades expressivas mais ricas.
Conforme Rodríguez (1998: 85), reconhece-se que o timbre é uma sensação
auditiva complexa que nos possibilita perceber a estrutura acústica interna dos
sons compostos e que é independente da duração, do tom e da intensidade, sendo-lhes,
contudo, simultânea.
"Intensidad
o propiedad por la que un sonido es más o menos fuerte.(.../...) Tono o
propiedad por la que un sonido es más o menos gráve o agudo. (.../...) Duración
o persistencia durante un tiempo. Es la velocidade com que aparece el sonido:
rápido, lento" (Cebrián,1995: 359)
A propósito da
entoação, Balsebre fala da melodia da palavra, componente desprezada com
frequência desmesurada na rádio que se ouve. Para ele, a expressão musical da
palavra radiofónica e a sua significação linguística são definidas
conjuntamente pela melodia ou pela entoação. Na expressão de Constantin
Stanislavski (citado em Balsebre, 1996: 57):
“El
subtexto es un tejido de esquemas innumerables y diversos dentro de la obra y
del personaje, hecho de "síes mágicos", cir¬cunstancias dadas, todo
tipo de ficiones de la imaginación, movi¬mientos internos, objetos de atención,
verdades pequeñas y gran¬des y la creencia en ellas, adaptaciones, ajustes y
otros elementos similares. Es el subtexto lo que nos hace decir las palabras
que de¬cimos en una obra»”.
No que diz
respeito ao ritmo, devemos ter em conta que varia em cada tipo de mensagem ou,
inclusivamente, ao longo da mesma mensagem. Não deve ser demasiado apressado
nem exageradamente lento. O primeiro pode “cansar” o ouvinte e o segundo pode
aborrecê-lo. Em qualquer dos casos ele “desliga” do que está a ser dito e até
pode "ligar" para outra emissora.
"En
un sentido más subjetivo, entendiendo el proceso de percepción ¬radiofónica
como una aprehensión de formas sonoras ininterrumpidas ¬en una secuencia, y
como percepción de una periodicidad previsible (…/…), ritmo es la periodicidad
percibida, la dimensión que fija la naturaleza de la periodicidad percibida, la
proporción en que son percibidas las distintas secuencias sonoras"
(Balsebre, 1996: 69)
A rádio,
tenho-o dito com frequência aos meus alunos, é o meio mais motivador de
imaginação no contexto mediático. A experiência mostrou-me isso inúmeras vezes.
Cito o exemplo de um colega de profissão que era dotado de uma voz jovial e de
grande expressividade. Estávamos no início dos anos 70 e os estúdios do Rádio
Clube Português, no Porto, ficavam perto de uma escola secundária feminina.
Umas quantas alunas pediram autorização para visitar os estúdios e disseram que
gostariam de conhecer o locutor tal. Lá veio o meu colega, careca, gordo,
baixinho. Desilusão completa para as meninas cuja imaginação tinha colocado
aquela voz num corpo muito mais interessante e sedutor. O cumprimento foi
cerimonioso e, no fim de contas, a visita aos estúdios não passou do hall de
entrada porque, estava visto, o que as meninas queriam era conhecer de perto o
seu “ídolo”. Só que ele estava nos antípodas daquilo que imaginaram e a
debandada foi imediata. Para desgosto do meu colega...
Guy Rossolato
(citado por Castarède, 1991:161) identificava na voz uma origem corporal,
orgânica e de excitação, e considerava-a uma força, um campo, um objetivo, de
prazer, ligado a uma tensão que é preciso reduzir, um objeto, para atingir um recetor,
assegurar uma comunicação. “Pode-se considerar a voz, e, por conseguinte, a
música, como uma metáfora do impulso em geral - o impulso sem outro representante
a não ser a própria música”.
Este impulso de
afeto e até de representação (não só através da música, mas também dos efeitos
e do silêncio) compõe a expressividade harmónica estruturada e estruturante,
dotando de sentido a mensagem apelativa da imaginação do ouvinte que a
completa. O que leva Balsebre (Ibd. 41) a dizer que
"El
tratamiento musical de la voz, sin perjuicio para la significación semántica
(inteligibilidad del texto en un contexto comunicativo), há de estar presente
también en la connotación estética de la palabra radiofónica. En la radio, la
componente estética del mensaje radiofónico transciende el significado
puramente lingüistico de la palabra. De outra manera, será muy difícil aceptar
la importancia de dimensiones acústicas, como la intensidad, el tono, el timbre
o el ritmo en la codificación de la palabra radiofónica".
A rádio digital
vem colocar todas estas exigências em relação à palavra radiofónica como
condição sine qua non para o comunicador avançar com novas propostas de
composição harmónica dotada de sentido estético, envolvendo agora uma
específica qualidade sonora e a particularidade de lidar com outros elementos
representativos traduzidos em dados (que podem representar, sons, textos,
imagens ou gráficos).
Os quatro tipos
clássicos de receção das mensagens radiofónicas foram explicados por Abraham
Moles (citado por Ortriwano, 1985: 82):
"a)
ambiental: quando o ouvinte deseja que a rádio lhe propor¬cione um "pano
de fundo", seja através de música ou de palavras;
b)
companhia: o ouvinte presta uma atenção marginal interrompida pelo
desenvolvimento de alguma atividade paralela;
c)
atenção concentrada: supõe que o ouvinte, mesmo exercendo outras atividades
paralelas, aumenta o volume do recetor, concentrando a atenção na mensagem que
lhe interessa;
d) seleção
intencional: é a seleção de um programa concreto por parte do ouvinte".
Considerando
que a enunciação discursiva na rádio é de base verbal, a voz é o elemento
principal da expressividade radiofónica. Num meio desprovido de imagem visual,
a voz adquire mais importância do que no teatro, no cinema ou na televisão.
Por definição,
eufonia significa som agradável, escolha harmoniosa dos sons, suavidade de
pronúncia. Efetivamente, o que se diz na rádio deve soar bem, além do
comunicador o dizer bem. Copeau (citado por Merayo, 1992: 296) dizia:
“Será
necessário que as vozes sejam bonitas. Será necessário que sejam simpáticas.
Será necessário que sejam diversas em maturidade. Será necessário que estejam
organizadas. Será necessário que sejam capazes de todos os tons, do mais
ligeiro murmúrio à declamação mais ampla e sustentada, até ao canto”.
Tais
exigências, imprescindíveis nos programas de criação, são também,
prudentemente, aplicáveis à informação. A alternância de vozes de timbres
diferentes e tom agradável melhora a apresentação das notícias, torna os
noticiários mais dinâmicos e, portanto, mais “fáceis” de ouvir.
A eufonia tem
muito a ver com uma locução adequada e também com a combinação harmónica da
palavra com os outros elementos sonoros. Embora de forma muito limitada, já é
possível ouvir efeitos sonoros e até musicais, a enquadrarem as notícias,
servindo de cortina separadora de temas. Mas, em tempos, o Rádio Clube
Português chegou a utilizar efeitos sonoros a separar cada notícia, fazendo
para o ouvido aquilo que o ponto e parágrafo fazem na escrita. Sabia o ouvinte
que tinha acabado uma notícia e ia começar outra.
Se ao caráter
expressivo da voz humana lhe acrescentarmos efeitos e cortinas musicais, como
timidamente alguns vão fazendo, a informação radiofónica identifica-se mais com
o meio que vive exclusivamente do som, adquire mais vivacidade e resulta num
verdadeiro espetáculo para o ouvido que se espera que a rádio seja. Tudo isto
no pressuposto estético e deontológico de não cair no ridículo e dispersar a
atenção do que verdadeiramente é importante - a notícia. A combinação dos
recursos sonoros que integram a mensagem radiofónica, deve não só adequar-se à
ética profissional como perseguir o sentido estético de uma verdadeira harmonia
acústica.
O princípio
essencial assenta no facto de os espaços de emissão deverem constituir um
conjunto harmónico com o todo da programação em que estão inseridos. Esta
harmonia, ambientação eufónica por extensão, exige que a todo o momento, os
diferentes elementos da mensagem radiofónica (palavras, música, efeitos ou
silêncios) se ajustem esteticamente, sem que transpareçam combinações bruscas,
desordenadas ou cacofónicas.
O nosso ouvido,
perante uma simultaneidade acústica, pode combinar vários sons, percebê-los
todos juntos e selecionar os que mais lhe interessem, subalternizando ou
desprezando todos os outros. Após a seleção, estão criadas condições para
corresponder à atenção dirigida e concentrar-se no que lhe interessa. Também
acontece que o nosso ouvido está condicionado por um determinado ritmo à
sucessão de sons que lhe apresentam. Assim, o ritmo musical ou o ritmo da
linguagem falada repercutem-se na audição e correspondente compreensão das
mensagens.
A saúde da voz
Depois do que
se disse sublinhe-se que as características da voz falada exigem que a
respiração seja natural. Assim, o ciclo completo de respiração varia de acordo
com a emoção e o comprimento das frases e a velocidade de fala, o que implica
uma inspiração relativamente lenta e nasal nas pausas longas, sendo mais rápida
e bucal durante a fala, com uma pequena movimentação pulmonar e da expansão da
caixa torácica. Estamos aqui no domínio da coordenação pneumofonoarticulatória.
O objetivo da
voz falada é, então, a transmissão da mensagem, com articulação precisa
mantendo a identidade dos sons. Vogais e consoantes com duração definida pela
língua que se fala. O padrão de articulação sofre grande influência dos aspetos
emocionais do falante e do discurso. Fala aparece espontânea e articulada.
Em nenhum lado
se aprende a falar com hesitações, com ruídos, com tropeções. Então onde é que
alguns dos nossos profissionais da rádio e da televisão, nomeadamente
jornalistas, vão buscar as bases para falar tão deficientemente?
Há tantos e tão
divertidos exercícios para fazer. Há tantos aspetos a cuidar na nossa voz. São
enormes as vantagens que obtemos conhecendo coisas elementares que os
profissionais da saúde nem acreditam que os comunicadores tudo façam para
menosprezar o seu instrumento de trabalho: a voz.
Daí que seria
interessante motivar os comunicadores, professores incluídos, a terem
conhecimentos de fisiologia (mecanismos e funções) da voz e cuidados com o
aparelho fonador, a evitar o abuso e o mau uso da voz no trabalho e,
principalmente, nas atividades extra profissionais. Evitar condições adversas:
ambiente refrigerado, poeiras, acústica inadequada, pressões psicológicas,
falta de hidratação adequada, falar fora de seu registo vocal, dinâmica
corporal inadequada, hábitos alimentares inadequados, consumo de tabaco,
álcool, e por aí fora.
A formação do
ouvinte/espectador, na minha compreensão, passa pela formação da sua cidadania.
Esse é o compromisso de quem é comunicador profissional.
Os cidadãos têm
uma forte componente de formação na medida em que os profissionais dos media
estimulem o seu gosto pela informação e lhes proporcionem estratégias de
conhecimento que lhes possibilitem a fruição máxima dos sentidos textuais. Daí,
então, as duas condições necessárias para a formação do
ouvinte/espectador/leitor: ter o prazer de ouvir par depois poder contar.
A primeira
condição não se circunscreve, é claro, apenas ao prazer estético ou ao lazer,
mas inscreve-se no atendimento das mais diversas necessidades de informação do
cidadão; a segunda, por sua vez, não é exclusiva dos media nem das salas de
aulas.
Os media e os
jornalistas não são os únicos responsáveis pela formação do cidadão: a família,
a escola e a sociedade, conforme os desenvolvimentos que a agenda setting tem
evidenciado, são corresponsáveis no processo formativo fundamental. Porque uma
criança recebe as influências da família, por cujas figuras parentais modela a
sua personalidade. Para ela, o ato de ler, por exemplo, não pode pertencer
apenas ao universo escolar. Assim, o indivíduo que vive em sociedade se quer
participar com consciência no processo de decisão tem de se informar.
É preciso,
então, termos a clara noção da partilha dessa responsabilidade de
formação/informação a fim de não remeter para o jornalista (apenas) ou a escola
(somente) ou a família (unicamente) ou a sociedade (exclusivamente) a sensação
de fracasso e o complexo de culpa pelo défice de cidadania. O problema que aqui
se colocou está antes de tudo isso. Localiza-se em razões tão elementares como
o saber escrever e saber falar para poder veicular informações. Ora se nós que
“O Papa foi internado com um problema cardio-respiratório” porque é que o
jornalista de rádio ou de televisão há-se dizer:
“a mmmmm o Papa aaaa foi internado mnhhhhh,
com um problema a cárdio-respiratório”?
Quem leva a
sério uma leitura nestes termos? Onde está a credibilidade de quem assim nos
fala?
Da forma como
raciocinei acima, posso ter dado a entender que todos os jornalistas optaram, a
partir dos anos 90, pela “mastigação” dos textos objetos das suas
leituras/notícia; não é, de forma alguma, tanto assim: o que tentei foi apontar
muito sumariamente a situação que se vive em alguma da nossa comunicação
mediática audiovisual.
BALSEBRE,
Armand, 1996, El lenguage radiofónico, ed. Catedra, Madrid.
CASTARÈDE, Marie-France,
1991, A voz e os seus sortilégios, Caminho, Lisboa.
CEBRIÁN
HERREROS, M., Mariano, 1995, Información audiovisual, Sintesis, Madrid.
MERAYO, Arturo,
1992, Para Entender La Radio, Upsa, Salamanca.
MELO, R. de,
2001, A Rádio na Sociedade da Informação, Ed. UFP, Porto.
MUÑOZ e GIL,
José Javier e César, 1986, La Radio Teoria y Práctica, IORTV, Madrid.
ORTRIWANO,
Gisela Swetlana, 1985, A informação no rádio, Summus Ed. - S. Paulo.
RODRÍGUEZ,
Ángel, 1998, La dimensión sonora del lenguaje audiovisual, ed. Paidós,
Barcelona.
Rui de Melo
Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad Pontificia de Salamanca
e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto
IV Congresso
Luso-Galego de Estudos Jornalísticos
II Congresso
Luso-Brasileiro de Estudos Jornalísticos
17/18 MARÇO
2005
A rádio tem a sorte de ter um estudioso como o professor
Rogério Santos. Entre várias obras publicadas, artigos e comunicações diversas,
tem HISTÓRIA DA RÁDIO EM PORTUGAL, em https://radio.hypotheses.org/.
Aconselho, a quem gosta de rádio, a passar pelo site. Lá se conta
muita coisa interessante. Deparei-me com a “Micas Eletromecânica”, figura que
conheci pessoalmente e cuja fama gerava invejas e maledicência. O Professor
Rogério Santos, com base numa carta depositada na Torre do Tombo, conta a
história que aqui se reproduz.
O Electro-Mecânico ficava na rua de Santa Catarina, por cima
da confeitaria Atlântida. Lembro-me do cheiro a bolos que pairava naquele
primeiro andar onde conheci a Liliana de Abreu, a Maria do Carmo, o Álvaro
Pacheco e o Alfredo Alvela, mais tarde, meus colegas no Rádio Clube Português. Júlio
Guimarães, Fernando Gonçalves, António Batista, Henrique Geração, Aníbal
Barroso frequentavam, mais ou menos assiduamente, os estúdios sempre em
renovação. Manuel Moreira foi dos
primeiros a comprar equipamento Ampex, de qualidade top em material de gravação
de som.
Por tudo isto estou à vontade para dizer que a senhora em
questão tinha cultura suficiente para não cometer um erro tão crasso. A mesma
história foi-me contada em Lisboa, pessoalizando-a também numa voz feminina. A
cultura “marialva” aproveitava tudo para subalternizar o papel da mulher na
sociedade.
Como esta, há muitas histórias, mais ou menos anedóticas, como
a do locutor que se despiu na cabine enquanto fazia a emissão, na jornalista
que falava do rio Cavado, em vez de Cávado, ou da que esmiuçava o mapa de
África para descobrir onde ficava o apartheid.
A resposta de Rogério Santos não tardou.
Caro Rui de Melo, caro amigo. Eu procuro nunca especular sobre um
assunto de História. A minha fonte é uma carta depositada na Torre do Tombo,
datada e assinada. Logo, não deve (pode) ser ignorada. A hipótese mais extrema
de erro por parte de quem escreveu seria a de uma calúnia numa época de censura
e maledicência, mas parece-me pouco provável. Os outros exemplos não os
comento, por não possuir documentação adequada.
A maledicência era corriqueira em relação a quem fazia
rádio, cantava, fazia teatro ou tinha um qualquer destaque público. Embora
criança, acompanhei todo aquele ambiente feito de gente interessada,
interessante, mas com alguma megalomania que, frequentemente, revelava uma
ausência completa do sentido do ridículo.
A carta da Torre do Tombo é semelhante a tantas outras que
aliviava as frustrações de certa gente. Umas vezes escondiam-se no anonimato e
outras usavam nomes inventados. Era um fenómeno muito frequente.
Conhecedor dos cuidados criteriosos do Professor Rogério
Santos, achei por bem dar-lhe o meu testemunho.
A Laura Moreira, por viver em união de facto com o
proprietário Manuel Moreira, situação "escandalosa" para a época, era
uma mulher de iniciativa, invejada e muito criticada. Dirigia peças de teatro,
convidava autores, fazia adaptações de obras consagradas. Por lá vi gente dos
"Modestos" e do "Experimental". Eu próprio fui dirigido por
ela em papéis infantis de teatro radiofónico.
Quando o Electro-Mecânico deixou a Rua de Santa Catarina e
se mudou para D. João IV, ela resolveu não acompanhar a mudança porque, julgo
saber, não concordava com ela. E lá se recolheu na casa do Jardim de S. Lázaro
onde morava.
Lembro-me da sua figura a um tempo bonacheirona, mas
determinada na sua "autoridade". O pessoal que por lá passava
tinha-lhe respeito.
Finalmente, quero expressar a minha admiração, o meu
respeito e agradecimento pelo trabalho desenvolvido pelo Rogério. É um serviço
público que não há dinheiro que pague. Um grande abraço do
Rui de Melo
Professor Associado, aposentado, da Universidade Fernando
Pessoa
Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na Universidad
Pontificia de Salamanca
e licenciado em Direito pela Universidade Católica do Porto
Reflexões vertidas para aulas por
Rui de Melo
Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na
Universidad Pontificia de Salamanca e licenciado em Direito pela Universidade
Católica do Porto
Professor Associado, aposentado, da Universidade Fernando
Pessoa
Tito Ballesteros López é colombiano e um comunicador social.
Especialista em Gestão de Comunicação Organizacional. É produtor, pesquisador,
coordenador e co-autor de diversos livros. Assina Cuadernos de radio que
disponibiliza em https://drive.google.com/drive/folders/1wiyZ2w-dsUcLiam2PJ-u12Ioc9I_0xOB.
Faz parte da muita informação que recebo de todos os
quadrantes, incluindo a América Latina onde há gente muito interessante no
estudo e na investigação em rádio. Só muito recentemente comecei a ler
trabalhos deste autor e acho que vale a pena partilhar com os meus seguidores
um texto singularmente criativo embora, naturalmente, especulativo. Sempre
entendi que a rádio implica criatividade, ser diferente e ter um estilo
próprio. O texto de que, parcialmente, vos dou conta, denuncia o gosto que
sempre tive em surpreender o ouvinte, em partilhar informação, em acrescentar
qualidade de vida ao ouvinte. Nesta linha, tive sempre gente muito inovadora
nos temas e respetiva abordagem como, entre muitos outros, foram os casos de
Costa Carvalho e Joaquim Fernandes, com Extravagário, o Século XX e OVNIs.
Criou-se, inovou-se, transmitiu-se conhecimento.
Sempre com os olhos e os ouvidos postos na realidade,
trabalhou-se a ficção, desafiando o ouvinte a acompanhar a nossa imaginação.
Julgo que esta breve introdução explica a divulgação das
ideias de Tito Ballestreros.
Ele parte do princípio que vivemos numa esfera digital movida
pelo conceito de objeto mudado ou Internet das coisas[1], que, no caso dos meios de
comunicação, modificará a rádio e, particularmente, as suas ofertas
programáticas.
Ele pensa em pessoas conectadas a aparelhos de escuta, a
partir dos seus próprios impulsos cerebrais, sintonizando os canais de áudio da
sua escolha. Essa nova noção de programação baseada em impulso irá ordenar ao
cérebro, com base nas impressões digitais de cada ouvinte, para contatar
qualquer meio no mundo via online e permitir o acesso a conteúdo específico.
A programação de rádio não será mais proposta por um comunicador
ou especialista em matéria de som, mas sim por uma espécie de algoritmos ou
sensores cerebrais. Além disso, a programação da rádio será alimentada por
outros conhecimentos que não a comunicação social e prevemos que intervirão físicos,
matemáticos, assistentes virtuais, inteligência artificial e até robótica.
Ballestreros avança na ficção dizendo que graças aos avanços médicos, as pessoas viverão mais, enquanto as experiências de rádio serão modificadas para servir a novos públicos. O texto sonoro terá uma ótima receção em pessoas entre 90 e 110 anos, as formas de narrar, portanto, mudarão e o meio não será nada sem a ajuda de suportes biónicos ou sentidos expandidos. As emissoras terão muito mais atores disponíveis para receber suas mensagens e o público será cada vez mais exigente. Começará a era do turismo espacial e aumentarão os programas de rádio sobre esta experiência e diariamente serão realizadas transmissões ao vivo do espaço. Tudo isso acontecerá no futuro e o fato de não participarmos disso não significa que não existirá.
Sabemos, por informações biológicas, diz ele, que a mudança de humor de uma pessoa pode ser modificada de acordo com o ambiente em que se encontra. O suporte da tecnologia e da Internet das Coisas, os humores podem mudar de forma autónoma. Práticas como mudar as cores das paredes de uma sala, acender ou apagar as luzes, escolher roupas, usar maquilhagem mais ou menos colorida no futuro serão simplesmente rotinas.A programação como a conhecemos hoje será uma coisa do passado. Outras formas florescerão. Os meios de comunicação, em geral, “vão-se render” ao público, vai construindo as suas ideias, agora sim, com ele. A inovação continuará a ser oxigénio para o meio de comunicação e, a partir de agora, o mundo estará sempre em beta, em teste.
As notícias, segundo
Ballestreros
As notícias deixam de ser massivas e os públicos focados nos
geo-hábitos vão querer ter informações personalizadas e tudo isso também vai
acontecer graças aos algoritmos e à chamada pegada digital. As rádios
noticiosas irão programar os seus conteúdos não apenas a partir do som, mas
comunicarão suas ideias a partir de propostas baseadas em novos e ampliados
sentidos externos como os proporcionados pela realidade aumentada.
As notícias deixarão de ser apenas ouvidas. Será possível
cheirar, sentir e ouvir através de um dispositivo móvel. Os odores de
reportagem de notícias deixados por uma explosão podem ser farejados por meio
de um dispositivo móvel. O teletransporte das informações ou convidados para a
cabine será diário[2].
Em alguns anos, o ouvinte controlará toda a experiência auditiva.
Com a superabundância de informações, a rádio perderá
credibilidade como meio de comunicação de massa, notícias falsas e não
confirmadas inundarão a sua vida e ganharão aqueles que mantiverem o melhor
equilíbrio informativo. não será necessário ter um rádio para ser informado. As
notícias vão saltar em todas as partes do mundo, vamos tropeçar nelas e é por
isso que a rádio noticiosa, que não oferece mais que notícias, perderá a sua
grande força, a sua zona de segurança. será necessário aprofundar a análise, a
convergência, em algo mais do que relatar a partir da já exaurida pirâmide
invertida, do quê, quem, como, quando e onde.
A rádio, as coisas
As cabines das estações mudarão a sua aparência sem
necessidade de grandes investimentos.
O dispositivo físico a partir do qual o meio de comunicação
é sintonizado, conectado à Internet, também permitirá o aparecimento de
hologramas. "Muda a frequência, os hologramas mudam”.
Graças à Internet das Coisas, a transmissão conectada à
Internet fornece aos produtores informações em tempo real sobre os temas que
estão a ser tratados em cada espaço sonoro. Estatísticas, dados, figuras, mapas
e recursos que serão conectados via Bluetooth para alimentar os conteúdos
programáticos quando necessário.
Os microfones biónicos terão discos rígidos. Em última
análise, com a Internet das Coisas, os objetos "pensarão" por si
próprios.
A partir do aparelho de escuta será possível saber
informações adicionais àquelas narradas por cada locutor, o aparelho a partir
de telas adicionais ou suspensas fornecerá links, bibliografias, dados, estatísticas,
etc.
Todos terão a voz que desejam. Graças à realidade aumentada,
os ouvintes podem "caminhar" virtualmente pelos locais descritos nos
programas de rádio. Se o locutor narra uma perseguição policial ao vivo e
direta, ela pode ser acompanhada a partir de realidade aumentada pelos ouvintes
como se estivessem no local dos fatos.
Usando implantes de chips no corpo humano, podem ser gravadas paisagens sonoras, por exemplo.
A música de cada estação pode ser personalizada. Pode haver
composições musicais ou arranjos feitos pela comunidade onde os meios de
comunicação estão localizados. A Internet das Coisas transformará as produções
sonoras em conteúdos envolventes. Ou seja, menos transmissores com mais recetores
participando da ação da rádio.
Todos os equipamentos recetores serão dotados de
inteligências que permitem traduzir qualquer mensagem e oferecê-la na língua do
lugar geográfico de onde o sinal é sintonizado. Os tradutores ficarão melhores
e mais rápidos.
A tecnologia impulsionará a criatividade temática. Outros
tipos de narrativas que não conhecemos hoje irão aparecer e os géneros e
formatos serão reformulados. O criativo da rádio nunca pode ser substituído, o
resto da equipe pode não ser necessário. Correr riscos sempre será importante e
fará, como hoje, a diferença entre um e os outros líderes de rádio.
A internet será regulamentada. Como modelo de negócio, a web
oferecerá respostas para formas reais de monetizar conteúdo, canais e
multicanais. Ninguém vai querer pagar por publicidade como hoje é feita nos
meios de comunicação porque a forma de promover os produtos encontrará mais
efeitos positivos nos espaços alternativos do que nos convencionais. O futuro
representa uma mudança de mentalidade para a publicidade: o comércio eletrónico
será sua nova plataforma, seu novo aliado.
Os futuristas dizem que até 2030 milhões de empregos
desaparecerão. As pessoas terão mais tempo livre. Os empregos serão escassos e
o ludismo reunirá todas essas experiências que procuram passar o tempo
utilizando-o em alguma atividade, então, a rádio terá um público ávido por
entretenimento, informação e participação.
Ballestreros antevê novos
dispositivos
Visualizadores de realidade virtual.
Assistentes virtuais para procura de notícias.
Dispositivos com inteligência artificial para aprender mais
sobre o público.
Novos sentidos fora do corpo para ouvir de forma diferente e
assim interagir com o público.
Mãos e dispositivos remotos para programar o meio de
comunicação.
Equipamento para projeção de holografias e transporte da
imagem para o aparelho recetor.
Microfones e terminais inteligentes que contribuem com
recursos para programas ao vivo.
Óculos para monitorar o público onde quer que esteja.
Simuladores para a realização de transmissões ao vivo.
Plataformas holográficas para fixar pontos de transmissão.
Roupas inteligentes para se conectar com o público e receber
informações.
Telefones inteligentes, autónomos e com inteligência
artificial.
Equipamento de tradução inteligente para quebrar a barreira
do idioma em espaços aéreos.
Monitores com áudio e vídeo da mais alta qualidade.
Dispositivos pequenos para armazenar grandes quantidades de
música.
Smart desks que vão “falar” com quem interage.
Cadeiras e móveis conectados à Internet.
Antenas e transmissores em tamanhos pequenos.
As edições de rádio podem ser feitas telepaticamente.
A rádio, que é uma tecnologia, é chamada a abraçar com todo
carinho e trabalhar em equipe com as novas tecnologias. A dinâmica da mudança exige
que os jornalistas de rádio mudem.
O caminho é incerto, mas, certamente, também emocionante.
Inspiração em Cuadernos de radio, de Tito Ballesteros López.
Fonte:
https://drive.google.com/drive/folders/1wiyZ2w-dsUcLiam2PJ-u12Ioc9I_0xOB.
Rui de Melo
Doctor en Periodismo y Ciencias de la Información na
Universidad Pontificia de Salamanca e licenciado em Direito pela Universidade
Católica do Porto
Professor Associado, aposentado, da Universidade Fernando
Pessoa
[1]
O conceito de Internet das Coisas foi proposto por Kevin Ashton no MIT Auto-ID
Center em 1999.
[2]
A palavra teletransporte foi criada pelo escritor e pesquisador americano
Charles Fort no início dos anos 1930. Ele usou a palavra para descrever a
conexão entre desaparecimentos e aparições misteriosas em diferentes partes do
mundo.
A linguagem sedutora da rádio Cristina Romo A rádio é o meio sonoro por excelência. É, seguindo McLuhan, a extensão da boca, da laring...